(...) Com 56 anos de advocacia e dezenas
de livros publicados, inclusive em parceria com alguns ministros do STF, (Ives)
Gandra (Martins), professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de
Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra, diz que o
julgamento do escândalo do mensalão tem dois lados. (...)
Folha - O senhor já falou que o julgamento teve um lado
bom e um lado ruim. Vamos começar pelo primeiro.
Ives Gandra Martins - O povo tem um desconforto
enorme. Acha que todos os políticos são corruptos e que a impunidade reina em
todas as esferas de governo. O mensalão como que abriu uma janela em um
ambiente fechado para entrar o ar novo, em um novo país em que haveria a punição
dos que praticam crimes. Esse é o lado indiscutivelmente positivo. Do ponto de
vista jurídico, eu não aceito a teoria do domínio do fato.
Por quê?
Com ela, eu passo a trabalhar com indícios e presunções. Eu
não busco a verdade material. Você tem pessoas que trabalham com você. Uma
delas comete um crime e o atribui a você. E você não sabe de nada. Não há
nenhuma prova senão o depoimento dela --e basta um só depoimento. Como você é a
chefe dela, pela teoria do domínio do fato, está condenada, você deveria saber.
Todos os executivos brasileiros correm agora esse risco. É uma insegurança
jurídica monumental. Como um velho advogado, com 56 anos de advocacia, isso me
preocupa. A teoria que sempre prevaleceu no Supremo foi a do "in dubio pro
reo" [a dúvida favorece o réu].
Houve uma mudança nesse julgamento?
O domínio do fato é novidade absoluta no Supremo. Nunca
houve essa teoria. Foi inventada, tiraram de um autor alemão, mas também na
Alemanha ela não é aplicada. E foi com base nela que condenaram José Dirceu como
chefe de quadrilha [do mensalão]. Aliás, pela teoria do domínio do fato, o
maior beneficiário era o presidente Lula, o que vale dizer que se trouxe a
teoria pela metade. (...)
Fonte: Mônica Bergamo, "Dirceu foi condenado sem provas, diz Ives Gandra", Folha de S. Paulo, Poder, 22/9/13.
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