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domingo, 21 de março de 2010 | | 0 comentários

"2012: O mundo não vai acabar"

O ataque é constante, um dilúvio de cataclismos horrendos que marcam o fim do mundo: tudo isso ocorrendo no dia 21 de dezembro de 2012 (ou será no dia 23?). Pelo mundo afora, milhões de pessoas escrevem em blogs, rezam, formam grupos e portais de "informação", acreditando que essas previsões sejam diversas do "bug do milênio" (alguém se lembra?) ou de centenas de outras profecias apocalípticas que falharam e que as pessoas têm uma incrível habilidade de esquecer.

Gostaria de contra-atacar essa onda de medos apocalípticos usando, sim, a luz da ciência e da razão. Mesmo que muitas dessas previsões sejam supostamente baseadas em ciência, a verdade é que não são. Se fossem, deveríamos levá-las a sério (o Sol, é verdade, explodirá em 5 bilhões de anos).

1) Fim do calendário maia: Deixando de lado o fato de que os maias não tinham como prever o fim do mundo, vamos examinar a "evidência" que mostra a relação entre o fim do calendário deles e o fim do mundo.

Os especialistas Linda Schele e David Freidel encontraram referências a eventos ocorrendo muito após o fim do calendário. Outros afirmam que a noção judaico-cristã de apocalipse não fazia parte da cultura maia. A fonte da profecia vem de um local no México chamado Tortuguero.

Especialistas mal conseguem decifrar os fragmentos encontrados lá: "O décimo terceiro [b'ak'tun] termina (no) 4 Ajaw, o 3º do Uniiw [3 K'ank'in]. Preto...ocorrerá. (Será) a queda (?) de Bolon Yookte" K'uh ao grande (ou vermelho?)..." Desse fragmento a uma previsão do fim do mundo baseada no profundo conhecimento cósmico dos maias é um salto vergonhoso.

2) Alinhamento galáctico: Alguns afirmam que os maias sabiam do alinhamento periódico entre o Sol, a Terra e o centro da nossa galáxia. Afirmam também que esse alinhamento causará o fim do mundo. A verdade é que esse alinhamento aproximado ocorre todo mês de dezembro. E a Terra sobrevive há mais de 4 bilhões de anos! Mesmo que todos os planetas se alinhassem -o que não ocorrerá em 2012 ou nas próximas décadas-, o efeito sobre a Terra seria desprezível.

Lembre-se de que a força da gravidade cai em proporção ao quadrado da distância. Se somarmos todas as massas dos planetas, obtemos em torno de 450 massas da Terra. O Sol, sozinho, tem uma massa 332 mil vezes maior do que a da Terra! Ou seja, a perturbação causada pelos planetas ou pelo centro galáctico é irrelevante.

3) Planeta Nibiru (ou Planeta X): Supostamente, os sumérios sabiam de um planeta que vai colidir com a Terra em 2012. Acontece que esse planeta simplesmente não existe! Se existisse, teria já sido detectado por astrônomos. Se fosse colidir com a Terra em 2012, seria visível a olho nu. Um objeto dessa magnitude causaria (pequenas) perturbações em outros planetas e asteroides facilmente detectáveis.

4) Tempestade solar: O Sol tem um ciclo de atividade de 11 anos e o próximo máximo ocorre entre 2012 e 2014. Plasma lançado da sua superfície pode atingir a Terra, causando auroras em altas latitudes. Alguns distúrbios mais violentos podem danificar satélites e causar apagões. O Sol poderia nos causar problemas sérios, mas não há previsão de que isso vá ocorrer em 2012 ou nos próximos milhões de anos.

Certamente, os maias não sabiam nada sobre a fusão nuclear.

Esse frenesi todo é irracional, promulgado por alguns setores dos meios de comunicação e oportunistas. Quem escolhe acreditar nisso está fechando os olhos para 400 anos de ciência, preferindo viver escravizado por medos que pertencem à Idade Média.

Fonte: Marcelo Gleiser, "Folha de São Paulo", dom., 21.3.2010, Ciência.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010 | | 4 comentários

Apocalipse now?

Hoje tive uma discussão (no bom sentido) com um entrevistado no programa “Fatos & Notícias”, da TV Jornal. Ele falava sobre um evento (festivo, acredite!) de uma igreja cujo lema será o fim dos tempos.

Ultimamente, talvez pela recente passagem do milênio e pelo crescente pentecostalismo no Brasil, essa história de final dos tempos tem ganhado destaque. Casos de violência e tragédias naturais, como as vistas no Brasil e no Haiti recentemente, acentuam a crença no armagedom. E quando falta informação, sobra deformação (para não dizer ignorância – no sentido literal da palavra, ou seja, de desconhecer algo, e não no sentido ofensivo).

Para muitos líderes, religiosos inclusive, quanto maior a ignorância, mais fácil a dominação.

Não pretendo entrar em discussões teológicas, dogmáticas, religiosas. Crer no apocalipse é questão de fé – portanto, de foro íntimo. No entanto, por dever jornalístico e respeito ao público, não posso (e não pude no programa desta segunda-feira na TV) deixar passar “argumentos” desprovidos de razão e sentido.

Crer que o mundo vai acabar porque assim foi dito pelo criador é, repito, questão de fé. Dizer que o fim dos tempos está chegando porque nunca houve tantas tragédias, guerras e doenças como agora já é outra coisa: beira iludir a fé alheia. Diga aí: alguém de boa fé catalogou as tragédias e assassinatos de ontem e hoje para fazer alguma comparação razoável que possa respaldar uma afirmação do gênero? Se alguém tiver uma resposta positiva, aceito. Do contrário, parece-me irresponsabilidade recorrer a esse tipo de argumento.

Vejamos: desde que o mundo é mundo, há violência. Para quem crê na história da criação, parece-me que está lá escrito que um irmão matou outro, não? Ou seja: os crimes familiares estão na raiz da humanidade do ponto de vista religioso. A própria Bíblia está repleta de casos de assassinatos, muitos deles entre parentes.

Até onde sei, a história da humanidade sempre foi baseada na guerra – gregos contra troianos, atenienses contra espartanos, romanos contra bárbaros, sem falar nas Cruzadas medievais (financiadas, diga-se, pelas ordens religiosas), nas conquistas de Alexandre e de Napoleão. Portanto, dizer que as guerras de hoje (quantas mesmo?) são sinal do fim dos tempos não me parece plausível.

E quanto às catástrofes? A erupção do Vesúvio não destruiu parte do sul da Itália, soterrando toda uma cidade (Pompéia) pouco depois de Cristo? Em meados do século 18 um grande terremoto não destruiu Lisboa? E no início do século 20, o mesmo não aconteceu em São Francisco? Ah, e as doenças? No início do século 20 não houve uma grande epidemia de gripe espanhola que dizimou milhões de pessoas (e numa época em que o mundo nem era globalizado e os contatos entre os povos nem era tão grande como hoje)? Ora, se estes são sinais do fim dos tempos, o fim está um tanto demorado...

O que há hoje, sim, em muito maior quantidade, é o acesso à informação. E numa rapidez sem precedentes. Há cem anos, levava-se dias, talvez meses, para se tomar conhecimento de um determinado acontecimento numa região um pouco mais distante. Há mil anos, muitas vezes nem se tomava conhecimento. Hoje, sabe-se do fato em segundos.

Há quem diga que o próprio Jesus falou que guerras, doenças, pai matando filho e filho matando pai, catástrofes, etc, seriam os sinais da sua volta. De fato, mas mais do que isso, para usar um recurso religioso, ele disse que só Deus saberia quando seria a hora. Só Deus! Portanto: viva a vida, o presente, faça o bem, ajude e ame o próximo (e, caso seja cristão, ame a Deus acima de todas as coisas) e deixe que o tempo se encarregue do resto.
***

Veja, pois, que este texto não tem como finalidade destruir a fé daqueles que acreditam na religião. Tampouco quero parecer incrédulo. Busco apenas colocar um pouco de luz a uma certa onda apocalíptica que, tal como um tsunami, tem invadido muitas mentes. Onda impulsionada pelo fanatismo, pela ignorância e pelo senso de oportunidade de alguns que têm contribuído exclusivamente para causar medo e atos de insensatez.

Exagero? Uma conhecida minha dia desses estava nervosa porque, “diante dos sinais do fim dos tempos”, não sabia se estaria entre os “144 mil eleitos que vão herdar o reino dos céus”. Sem falar em alguns que dizem ter a “certeza” de que serão salvos, esquecendo-se de que o próprio Jesus chamou consigo para o reino de Deus um ladrão que estava ao seu lado na cruz e que se arrependeu no último instante.

“Orai e vigiai!”

A propósito: Marcelo Coelho escreveu no último dia 13 na Ilustrada, na “Folha de S. Paulo”, um artigo com o provocativo título “Deus existe?”. É uma interessante discussão entre fé e ciência, razão e emoção. E para quem pensa que o racionalismo puro é louvado, sugiro a leitura. Os protagonistas são o filósofo Paolo Flores d´Arcais e um certo Joseph Ratzinger, ainda como cardeal.

Para facilitar, já que muitos não têm senha para acessar os textos da “Folha”, reproduzo-o no campo de mensagens desta postagem. É só acessar lá.