terça-feira, 24 de fevereiro de 2009 | | 1 comentários

Novos jornais

domingo, 22 de fevereiro de 2009 | | 0 comentários

"Procura-se um nome"

"A invenção que é o espetáculo nos sambódromos do Rio, de São Paulo e de seus imitadores, sendo já o paulistano uma imitação do carioca, ainda leva o nome genérico de Carnaval e o nome particular de desfile das Escolas de Samba. Não é um, nem é outro. Usa aqueles nomes por apropriação indébita. O que é, não sei, e jamais ouvi sequer sugestão a respeito.

Tais como são, esses acontecimentos anuais refletiram, na sua origem, o espírito de "Brasil Grande" que inundava o país de propaganda da ditadura, ainda em sua pior fase. Como padrão estético, se a expressão não exagera demais, aderia e projetava o "padrão Globo" que então começava a impor-se, com a multidão de cores e formas de gosto suburbanamente duvidoso, e constituía a manifestação integral do espírito de "Brasil Grande".

As características do acontecimento levado ao Sambódromo do Rio foram criadas sobretudo por Joãosinho Trinta, desde então saudado acriticamente como prodígio de criatividade. Mas a hábil apreensão do espírito propalado, adaptando a grandes dimensões e a algum repique de tamborins os desfiles à velha maneira europeia (já outrora adaptados aqui pelas Grandes Sociedades), não bastaria para materializar a ideia. Era necessário dinheiro farto e fácil. E um dos repositórios mais satisfeitos por esse dinheiro são os bolsos dos bicheiros. De antigos signatários das listas de arrecadação das escolas de samba autênticas, os bicheiros passaram a tutores, financiadores, presidentes e diretores, orientadores e representantes políticos e sociais das entidades que tomavam o lugar das escolas originais. Donos.

Há mais proximidade entre contravenção e ditadura do que se ousou reconhecer, não só à época, mas até hoje. Graças ao grande poder de influência nos seus domínios ditos carnavalescos, os bicheiros ganharam da ditadura, e da política em geral, passe livre para suas atividades convencionais e, ainda melhor, para enveredar por novas especialidades. Eventuais situações incômodas, só como decorrência de disputas entre políticos, realidade que perdura. Simbólico, mas nem de longe caso único, da proximidade entre contraventores e ditadura aí está, ainda, o capitão Guimarães, que passou direto dos quartéis de repressão e tortura para o controle de uma rede de jogo de bicho e coliderança da classe.

Com a solução financeira, criou-se uma ciranda desatinada. Vários fatores provenientes do novo espetáculo, a começar do preço das entradas, afastaram do Sambódromo carioca o chamado povão. Mas quem, na realidade, paga a maior parte do espetáculo é o povão. Porque é o povão que, na vã esperança de ganhar algunzinho no bicho, engorda os cofres dos bicheiros. É a mágica à brasileira: tiraram do povão o que ele criou e o fazem pagar, sem saber, o custo do que o usurpou e falsifica a sua criação.

Contribuição triste para isso tudo foi a boa intenção do Sambódromo, como projetado por Niemeyer. Sua insipidez estética, a capacidade de acumular calor, o desconforto das arquibancadas já seriam deploráveis. A criação de áreas em tudo privilegiadas, para a comodidade dos camarotes reservados à riqueza e à mediocridade "célebre", completa a contribuição com evidência e ênfase definitivas.

Se o povão fica à margem, Carnaval não é. Misto de exibicionismo por si só, e de chamariz para o turismo sexual, e de montagens delirantes, e sem a alegria tipicamente carnavalesca, Carnaval não é. A música? Boa ou ruim, samba não é. Um ritmo sem nome, criado para um espetáculo sem nome próprio."

Texto de Jânio de Freitas, publicado na "Folha de S. Paulo" neste domingo 22/2/2009

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009 | | 0 comentários

Mais pílulas políticas

SÓ UMA CONVERSA
Reproduzo a seguir um diálogo recente que eu tive com uma figura do “staff” do prefeito Silvio Félix (PDT). A primeira fala, um tanto irônica, é do interlocutor:
- Você gosta bastante do prefeito, hein...?!
- Respeito-o como autoridade legitimamente eleita. Não tenho nada contra ele.
- Mas eu tenho muita coisa.
Dá até medo de pensar quais motivos levaram a essa manifestação...

ODORES
Fala de um político que esteve muito, muito no poder:
- Nesse esquema eu não me atrevi a mexer.
O tal esquema realmente cheira mal, muito mal...

CONSTATAÇÃO
Se o mundo soubesse o que os políticos falam em “off” (linguagem jornalística usada para designar uma conversa em sigilo) veriam que o abismo ainda é muito mais embaixo do que se imagina.

LÁ E CÁ
Deu no “Jornal da Cidade”: pelo menos sete vereadores fizeram críticas e cobranças ao prefeito de Bauru, Rodrigo Agostinho (PMDB), e a secretários municipais. Deu no jornal “Cruzeiro do Sul”: a Câmara de Sorocaba montou uma comissão especial para investigar supostas irregularidades nos contratos com as empresas responsáveis pelo fornecimento de merenda escolar na rede municipal.
E nos jornais de Limeira, quais são mesmo as notícias sobre os vereadores? Deixa para lá...

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009 | | 2 comentários

Vai buscar...



Esta é para animar a sexta-feira - 13!

Ah, vai, vai, vai buscar Dalila!!! Ligeiro!!!

PS: dedicado a Dalila Moraes.

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Obama: alforria ideológica

Um dos intuitos deste blog é compartilhar leituras que considero interessantes. A seguir, reproduzo o texto "Para Barack Obama, presidente", feito por Daniel Marcolino, estudante de Jornalismo do Isca Faculdades. Ele traz - num belo texto -uma visão diferenciada, que mistura um pouco do muito que já se falou sobre o novo presidente dos EUA com um viés particular do autor. Vale a pena!

"Querido Obama,

Esta carta é como outra qualquer. Mas gostaria que fosse lida apenas por pessoas de alma já formada. Pessoas que ainda não foram violadas pela torrente de opiniões superficiais e heterogêneas a seu respeito. Não que eu queira defender uma verdade absoluta. Desejo somente usar de democracia para, com júbilo e ironia, expor meu humilde ponto de vista. Peço-lhe licença, despojo-me de toda eloquência para, de pés descalços, falar o que alguns já suspeitam: os negros estão mudando de armas, estão tencionando reformas.

Em criança, confesso que sempre me perguntava se havia tomado sol demais ou se o Deus havia me pintado para desta forma facilitar a localização. Cresci e vi que as cores são irrefutáveis. Que fazer de minha cor, então? É fato que cada cor remete a um sentimento, um estereótipo. E, como na política, é necessário mais do que força de espírito e intrepidez para romper com estruturas errôneas a fim de instaurar novos modelos.

Um novo modelo. Insólito até, mas novo. Você cheira coisa nova, Obama! Daí toda esta inquietação, estes comentários sorrateiros e em si mesmos tão incertos. É que de repente descobrimos que tudo que dizem a respeito dos negros não procede – não que acreditássemos nos outros, mas não acreditar em si já é prejudicial. Sua eleição foi uma espécie de alforria ideológica.

Sei que não ostentas bandeiras raciais, tampouco é o messias dos pobres e pretos e oprimidos. Também eu luto por coisa maior que cor, que sentidos: o que quero ainda não tem nome. O lado sublime de sua eleição, no entanto, foi ver o declínio da obviedade, pois toda obviedade é burra. Mas até você já percebeu quão raro é ter um negro no comando. Neste continente, isso é choque cultural.

O que ficou claro para mim é que não existe predestinação. Devemos sempre trabalhar com a probabilidade do êxito. Ficou claro também que podemos, com louvor, exterminar qualquer resquício do cativeiro em que fomos um dia submetidos para abrir largos espaços na vida. Grande estrategista que você é... fez da honestidade uma arma ardilosa contra seus acusadores, e da inteligência a premissa básica para articulação da paz.

Em suma, Obama, bom é não estar inerte frente à nossa função cosmopolita de agregar ao mundo. Cada qual à sua maneira, procura juntar alguma coisa que era essencial e não se sabe onde foi perdida. Sei que você também não acredita naquela máxima de que “todos somos iguais”. Não. Reconhecer a pluralidade humana já é um passo rumo à humanização. Somos iguais apenas em termos de potencialidades – assim como Michelle, esta sua esposa que é obstinada e decidida, um exemplo para as mulheres.

Sobre os negros, sinto renovo geral. A dívida é alta, os juros também. Ainda assim, regozijo com a vitória declaradamente incolor, certo de que podemos perdoar as dívidas históricas se nos oferecerem contrapesos. Devemos estar abertos ao diálogo, não é? Afinal, ninguém pretende provar nada, embora, no meu caso, haja aquela revolta quase infantil de ter sido roubado ao nascer. O que se pretende, deste modo, é recuperar uma dignidade e um respeito que, uma vez encontrados, juro por Deus, são capazes de destronar reis e presidentes, principados e potestades."


Texto extraído do blog http://www.oportalddonson.blogspot.com.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009 | | 0 comentários

TV ameaçada

Limeira corre risco de perder uma concessão de televisão. A Limeira Televisão Cidade Modelo Ltda, que ganhou o direito de explorar o canal 4, até o momento não iniciou operações e pode ter a outorga cancelada. É o que prevê edital de notificação do Departamento de Acompanhamento e Avaliação de Serviços de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações, publicado ontem no Diário Oficial da União.

Conforme o edital, a empresa tem prazo de 15 dias a partir da publicação para exercer seu direito de defesa em virtude de não ter dado início à execução do serviço outorgado, descumprindoo disposto no artigo 53 do Decreto 5.371, de 17 de fevereiro de 2005.

Situação semelhante atinge uma série de outras empresas detentoras de outorga para executar serviços de retransmissão e repetição de televisão em todo o País.

O edital - assinado pelo coordenador-geral de Acompanhamento de Outorgas, Jayme Marques de Carvalho Neto - estabelece que as empresas, caso não se manifestem no prazo estipulado, ficarão sujeitas à pena de cassação, tendo processo de apuração de infração instaurado e analisado na condição de revelia.

Informações podem ser obtidas no site do ministério - www.mc.gov.br.

Em tempo: este blog desconhece os responsáveis pela Limeira Televisão Cidade Modelo.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009 | | 0 comentários

Vá-se embora pra Pasárgada!

Quando costumava ficar encabrunhado tempos atrás, sempre repetia uns versos de Manuel Bandeira, aprendidos no colegial. Por algum motivo, eles ficaram em minha mente. Embora indiquem uma certa ilusão, uma fuga da realidade em busca de um paraíso inexistente, esses versos me acalmavam e alegravam. Sim, faziam-me rir. Foram - são e serão - sempre válidos, ao menos para mim.

Sempre que falava esses versos, alguns colegas riam, não entendendo o que eu queria dizer. Eu sabia o que eles queriam dizer e isto já me bastava.

Hoje, quero dedicar esses mesmos versos a um amigo (e ele há de saber o que eles querem dizer).

"Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica

Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo

É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
- Lá sou amigo do rei -
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada."

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Pós-tempestade

Os dias têm sido chuvosos em Limeira. Muito chuvosos. No sábado, um temporal caiu sobre a cidade durante a tarde. Graciosamente, após a chuva, dois arco-íris apareceram. Como de praxe, um mais forte, outro mais fraco. Um arco-íris sempre é um momento interessente por sua relativa raridade. No campo religioso, diz-se que é um sinal da ligação de Deus com a humanidade. No campo científico, trata-se de um fenômeno óptico gerado em razão da refração da luz nas gotículas de água no ar.

Seja como for, um arco-íris é sempre belo. E especial. Ele transmite uma sensação diferente, de alegria, de paz.

Pois como o arco-íris de sábado surgiu quando eu mexia em uma máquina de fotos, não perdi a oportunidade.

Esta foto é inspirada em Mondrian.

Esta me lembrou aquele momento de fios tradicionais nas favelas.

E esta, feita por um amigo, é apenas isso: um arco-íris.

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O ser humano e a crise (ou sobre preconceitos)

Algumas coisas acontecem na vida que nos deixam em dúvida se realmente estamos no século 21. Ou se estamos avançando. Domingo, li na coluna da Mônica Bergamo, no caderno "Ilustrada", da "Folha de S. Paulo", uma entrevista que me deixou estarrecido. Ela foi feita com quatro namoradas/esposas de investidores do mercado financeiro. Em pauta, os reflexos da crise mundial na vida pessoal.

As respostas deixam claro como, para muitas pessoas, o "ter" prevalece sobre o "ser". Como, para muitas pessoas, a aparêcia prevalece sobre a essência. Como, para muitas pessoas, o ser humano ainda é medido pelo seu local de nascimento, suas posses ou coisas assim. Lamentavelmente.

Se acham que estou exagerando, tirem suas próprias conclusões:

"Folha - Uma amante faz parte do arsenal de status do investidor?
Fernanda - Claro, de todos.
Ana - Eu não penso nisso.
Mariana - Não é coisa de investidor, é de homem.

Folha - Recentemente, entrevistei um psicanalista que acredita que os investidores escolhem suas mulheres pensando mais em fazer uma dupla social boa do que no amor.
Mariana - Rola isso, sim. É até feio falar, mas a ex-namorada do Marcelo era uma "baianinha". Tenho certeza de que o fato de eu ter morado no mundo inteiro, falar línguas, conhecer pessoas o levou a pensar: "Vou ficar com esse fim de mundo (a "baianinha") ou fazer essa troca?". E me escolheu.
Ana - O Cris tem pavor de mulher feia. Gorda? Não pode ver.

Folha - Como enfrentar a crise?

Mariana - Quando a gente pensava em abrir um vinho de preço exorbitante, o Marcelo dizia: "Não vamos abrir esse, não. Vai que a gente precise vender...".
Todas riem muito.
Ana - É cada coisa louca. A gente ficava imaginando vender o carro e ter que andar num "Unozinho", sei lá, vender a casa, sabe quando você começa a pensar? Vender a mãe pra recuperar o que eu perdi e investir..."


PS: para quem quiser, a íntegra da entrevista está disponível em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq0802200907.htm

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"O castelo é Brasília"

"O escândalo do momento não deveria ser o castelo do deputado Edmar Moreira (DEM-MG) mas o fato de que o Congresso Nacional é, ele próprio, um grande castelo, se se tomar castelo como sinônimo de um sistema político mais próprio do absolutismo monárquico que da democracia.

Sob aquelas duas cuias da praça dos Três Poderes, vivem reizinhos, um punhado de barões e não mais que meia dúzia de gente que de fato faz política no sentido de atuação em favor da coisa pública.

É uma típica corporação medieval, que protege os seus integrantes contra vento e maré -nos raros momentos em que há vento e maré contra eles.

Não, não pense que a fase atual, em que há assanhamento a respeito do castelo, represente um incômodo sério para essa gente. Nada. A grande maioria sabe que sua reeleição não depende de a mídia apontar o dedo para eles, mas da capacidade de engabelação de súditos desprovidos de informação, muitas vezes desprovidos de condições mínimas de vida digna e que veem nos donos dos castelos -reais ou fictícios- seus suseranos.

Só assim se entende que barões e reizinhos busquem, segundo esta Folha, uma "saída honrosa" para Edmar Moreira, que seria retirá-lo do cargo de corregedor, sem afastá-lo da Mesa Diretora.

Posto de outra forma, Edmar Moreira não serve para zelar pela correção de seus pares, mas serve para participar do comando deles -uma maneira indireta de confessar que reis e barões não estão minimamente preocupados com a correção. Só querem que cesse o ruído de alguns aldeões.

Uma reportagem da revista "Veja" de dez anos atrás já levantava dúvidas sobre o castelo. Tampouco são de hoje as acusações e ações legais contra Moreira, que revelam comportamento incompatível com o decoro parlamentar.

Mas a Corte protege os seus, façam os seus o que fizerem."

Texto de Clóvis Rossi, publicado domingo, 8/2/2009, na "Folha de S. Paulo" (p. 2)

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009 | | 0 comentários

A entrevista com Paixão

Por uma dessas coincidências da vida, as últimas grandes entrevistas concedidas por duas das personalidades mais influentes e controversas da história recente de Limeira foram concedidas a mim. Refiro-me aos ex-prefeitos Jurandyr Paixão e Paulo D´Andréa. Ambos morreram algum tempo depois das conversas que tivemos.

Paixão e D´Andréa protagonizaram por décadas uma disputa política que movimentava a cidade e arregimentava seguidores. Não faltaram de parte a parte episódios polêmicos. Curiosamente, ambos se sucediam no poder, diretamente ou por meio de seus candidatos, dificilmente fazendo seus sucessores. Foi assim em 1988, quando Paixão – após um governo cheio de obras – viu seu candidato perder para D´Andréa. E este, em 1992, viu seu candidato perder para Paixão.

Entrevistei Paixão em 24 de junho de 1999. Prefeito de Limeira por três vezes (1960-64/1983-88 e 1993-96) e ex-deputado federal, Jurandyr da Paixão de Campos Freire vivia um declínio em sua carreira política. Após enfrentar sérios problemas de saúde, que o impediram de participar mais ativamente da campanha eleitoral do ano anterior, na qual concorreu para deputado, o ex-prefeito dificilmente falava com a imprensa. Sua rotina se resumia a uma breve passagem pelo Centro, diariamente, por volta das 11h, indo a um estacionamento dirigido por um assessor (talvez o único que lhe restou naquela altura da vida). Ficava por lá cerca de uma hora, uma hora e meia, e depois se recolhia ao lar, onde recebia visitas restritas.

O ex-prefeito estava lúcido, loquaz, porém, mais amadurecido. Estava naquela fase da vida em que a pessoa revisa tudo o que fez. Isso não o impediu de soltar suas tiras sagazes, ácidas, irônicas – endereçadas a alguns inimigos políticos. Pareceu-me sincero ao revelar paixões e ressentimentos, mas não sincero o suficiente para usar argumentos mais verossímeis diante de antigas questões.

Ainda fumava muito, como sempre. Mantinha um jeito de falar um tanto agressivo, que intimidava os mais despreparados. Naquele momento, já sabia que seus sonhos de fazer sucessores na família estavam arruinados. O único que se arriscou na política, o filho Jurinha, ex-deputado federal e secretário de Estado, estava fora da cena nacional, envolto a problemas com a Justiça.

Por mais que Paixão tivesse endereço certo, encontrá-lo para aquela entrevista não foi fácil. Tinha conseguido um contato dentro do estacionamento (uma fonte, no jargão jornalístico), que me avisava sempre que o ex-prefeito chegava. O esquema, inclusive, estava acertado com o fotógrafo do Jornal de Limeira, Maurício Martins. Por duas vezes, porém, corremos até lá e ele já tinha saído. Depois, por uma semana, Paixão desapareceu (será que havia sido informado da nossa intenção de entrevistá-lo?). Até que naquela quinta-feira de junho, lá o encontramos, conversando tranquilamente numa sala do estacionamento na Praça Toledo Barros.

Paixão reconheceu o fotógrafo do Jornal de imediato - afinal, foram anos de cobertura da prefeitura pelo Maurício. A mim, um jovem repórter iniciando a carreira, questionou – num certo tom de humildade - por qual motivo ainda queríamos ouvi-lo. Por tudo o que ele representou para a cidade, respondi. O ex-prefeito topou falar. Não fez restrições. Foi uma conversa agradável. Durou cerca de uma hora. E resultou no material que reproduzo a seguir (para facilitar o entendimento do contexto, acrescentei aqui algumas informações entre parênteses ou por meio de notas):

Jornal de Limeira – Como estão os contatos políticos para a eleição municipal de 2000?
Paixão –
Meu ciclo político está encerrado. Sinceramente, não sinto mais vontade de ser candidato. Vou apenas cumprir com o meu dever de ir votar.

Jornal – Mesmo não querendo, o sr. ainda é um nome forte. Não foi procurado?
Paixão –
Não. Se o meu partido (PPB, atual PP, no qual havia ingressado há algum tempo depois de décadas no PMDB) indicar um nome em Limeira, posso até apoiar. A verdade é que ninguém quer mais fazer política como no meu tempo. Era por amor. Agora, só pensam em dinheiro.

Jornal – Se não vai participar, como o sr. analisa os possíveis candidatos?
Paixão –
Deveremos ter vários candidatos. Parece que o (Antônio Carlos) Mesquita é candidato. Ele tem uma vantagem: está com vontade. E é preciso isso. Dos atuais possíveis candidatos, votaria no Mesquita. Acho que o Pedrinho (Kühl, ex-prefeito que o sucedeu) sai candidato. Ele gostou. É um forte candidato. Pegou a onda do “bonzinho” e isso ainda vai levar algum tempo. A população ainda não separou bem o político da pessoa. Já o Memau (ex-prefeito Waldemar Mattos Silveira) tenho a impressão que apoiaria o Mesquita.

Jornal – E a Elza Tank (PTB)?
Paixão –
Nem vou repetir esse nome. Foi uma das maiores decepções da minha vida pública. Foi traição. Mas tenho a impressão que sai candidata. O sonho dela sempre foi ser prefeita de Limeira.

Nota: a mágoa de Paixão era tanta que, embora eu não tenha registrado na versão publicada da entrevista, tão logo citei o nome da ex-deputada estadual e atual vereadora, aliada de sempre do ex-prefeito até que ambos romperam, ele disse: “Você devia limpar sua boca sempre que falar esse nome”.

Jornal – Como o sr. analisa o governo Kühl (1997-2000/2001-2002)?
Paixão –
Não mudou nada a cidade. O que fez até agora? Só está reformando obras minhas e reinaugurando. As grandes obras que eu que as deixei engatilhadas. Cadê a galeria da Tiradentes, que deixei acertada? Ele não disse que ia trazer indústrias para Limeira? Aponte uma que eu fico satisfeito. Até a Acil, que é do grupo dele, está cobrando. A verdade é que o Pedrinho se empolgou a passou a acreditar que é semideus. Isso não existe na política. Está na hora de mostrar a que veio. Precisa acabar com essa história de “bonzinho”, que a culpa é do assessor. Quem governa é o prefeito, assessor só cumpre ordem. Torço para que a administração do Pedrinho dê certo. Mas ele vai entrar em uma época de turbulência política, por causa das eleições.

Jornal – E sobre o relacionamento do prefeito com o governador Covas (de quem Kühl se dizia amigo)?
Paixão –
Não existe ajuda. O que o Covas fez por Limeira? Paralisou tudo e tirou todas as regionais da cidade. Acho que o prefeito tem obrigação de correr atrás dele e reclamar.

Jornal – O que o sr. poderia dizer sobre as últimas eleições (1998)?
Paixão –
A cidade ficou sem representante e isso é ruim. Eu tive um problema sério de saúde durante a campanha. Praticamente não fiz campanha. Cuidei da minha saúde. Agora, estou em forma.

Nota: durante aquela campanha, várias vezes circularam boatos de que Paixão havia morrido.

Jornal – Como o sr. avalia o governo Fernando Henrique?
Paixão –
Está ruim. Ele é um homem dotado de todas as qualidades para o cargo. Mas na minha opinião, precisa mandar. Já falei isso para ele. Hoje, não há um setor satisfeito com o governo. O povo está no limite de tolerância. Na verdade, o mau deste País é que o governo não faz maioria. Assim, fica uma colcha de retalhos.

Jornal – Como o sr. analisa a “disputa” entre a prefeitura e a Águas de Limeira (a primeira se recusara a aumentar a tarifa de água e a segunda, em consequência, paralisou os investimentos)?
Paixão –
Não entendo. A população está satisfeita e o prefeito fica atacando a empresa. Eu sei que a coisa mais chata é dar aumento de água e ônibus. Mas tem que fazer. O Pedrinho quer o serviço de volta. Se tomar, não toca. A melhor coisa do meu governo foi essa concessão (do SAAE). Livrei Limeira de ter problemas com água. Agora, querem fazer política sobre isso.

Jornal – Já que o seu ciclo político está encerrado, como o sr. o analisa?
Paixão –
Fiz muitos amigos. Disputei oito eleições e perdi só uma. É um bom saldo. Confesso que não esperava ter a votação irrisória da última eleição (teve 7.180 votos na disputa por uma vaga na Assembléia Legislativa). Mas faz parte do jogo. Aliás, arrebentaram com a minha candidatura. Espalharam que eu tinha morrido. Mas tudo se paga aqui mesmo.

Jornal – Como o sr. gostaria de ser lembrado?
Paixão –
Como um homem que sempre procurou fazer o bem. E um realizador. Queiram ou não, ninguém repetirá mais em Limeira o que eu fiz em obras. Principalmente no segundo mandato.

Jornal – O sr. se arrepende de alguma coisa?
Paixão –
Na verdade, não devia ter deixado o Congresso para disputar a prefeitura na última eleição que eu venci, em 1992. Deveria ter continuado como deputado federal. Também não disputaria essa última eleição para deputado. Fui a pedidos. O episódio do chicote (Paixão invadiu a Câmara com um chicote, em 1990, à procura do então vereador Tancrede Orsi) é um ato lamentável da minha vida. Jamais faria isso de novo.

Jornal – Quem foi o seu maior adversário político?
Paixão –
Paulo D´Andréa. Além da política, era um inimigo pessoal. Comprei brigas com ele por muita coisa que outros falaram. Foi um adversário à altura. Tínhamos prestígio. Ele conseguia aglutinar muita gente. Até hoje consegue. Mas, na minha opinião, o maior nome da política de Limeira hoje é o Memau. Tem carisma. Mesmo afastado, manteve a característica de “bonzinho” e do bom governo que fez.

* Entrevista publicada no Jornal de Limeira em 27 de junho de 1999, pág. 7. A foto é de Maurício Martins

* PS: Mesquita e Elza não foram candidatos a prefeito no ano 2000; Kühl foi reeleito na ocasião. Em 1998, Jurinha disputou sua última eleição, fazendo dobradinha com o pai: teve irrisórios 7.567 votos e não se reelegeu deputado federal. Desde então, praticamente não se tem notícia dele - que não compareceu ao enterro do pai, falecido na noite de 13 de novembro de 2002, uma quarta-feira, aos 72 anos, por falência múltipla de órgãos.

* Em tempo: nessa mesma entrevista, Paixão soltou a seguinte máxima, não publicada no Jornal: "Pequenas obras, grandes negócios". A que ele se referia só o Maurício e eu sabemos...

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009 | | 1 comentários

O dever do prazer

Estava assistindo segunda-feira ao programa “Roda-Viva”, da TV Cultura, que teve como entrevistado o filósofo e sociólogo esloveno Slavoj Zizek, quando me lembrei de minhas aulas de filosofia. Mais precisamente da primeira aula, cujo tema era: “para que serve a filosofia?”. Em resumo, o texto pregava o valor da filosofia como reflexão e manifestava, com certa ironia, que quem considerasse a reflexão uma inutilidade, então poderia classificar a filosofia de inútil.

Digo isso porque muitas das manifestações de Zizek foram, para usar um jargão popular, contra a maré. E é sempre importante alguém remar contra a maré, por mais absurdo que isso possa parecer. Se não servir para mudar uma realidade, ao menos essa contracorrenteza gera uma certa inquietação, faz pensar.

Durante a entrevista, o filósofo discutiu o que chama de “dever do prazer”. Segundo ele, o modelo de vida da sociedade contemporânea, individualista e um tanto libertário, cujo valor principal é “fazer o que dá prazer” (independentemente de dinheiro, etc), acabou produzindo efeitos colaterais danosos: o estresse e a depressão.

Por esse raciocínio, na medida em que a sociedade estabeleceu como valor a busca pelo prazer (entendido não do ponto de vista sexual), tornou essa busca um fardo, uma obsessão, um objetivo a ser atingido a qualquer custo. Um dever. E quando não se atinge um objetivo ou não se cumpre um dever, vêm a depressão, o estresse... O que seria, portanto, um prazer acaba virando um tormento. O que se propôs como uma libertação acabou virando uma prisão.

Ao ouvir o filósofo, pus-me a pensar na vida. Muitas vezes, sentimo-nos aflitos, angustiados, e não sabemos bem traduzir o que esses sentimentos estão manifestando. Talvez a resposta esteja no tal “dever do prazer” citado por Zizek. O que acham?

Em tempo: o filósofo esloveno vê na atual crise mundial um perigo (e não é meramente econômico). De acordo com Zizek, mais do que sinônimo de oportunidade, uma crise é sempre perigosa. A atual, por exemplo, pode fazer emergir – como já se aparenta, na visão dele – uma reação da direita conservadora. A história está carregada de exemplos de momentos de crise que resultaram em totalitarismos.

PS: Zizek disse gostar do Brasil, vê o País como estratégico no cenário mundial, mas odeia carnaval.

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Pílulas políticas

Déjà vu político
Ao ver que José Sarney e Michel Temer (ambos do PMDB) venceram as disputas para o comando do Senado e da Câmara Federal, respectivamente, é impossível não ter a sensação de que às vezes o Brasil não avança. Ao menos no campo político. Quando se pensa que novas figuras estão surgindo, eis que os caciques dão as cartas – e as caras.

Lá e cá
O novo presidente dos EUA, Barack Obama, admitiu que “pisou na bola” na forma como procedeu na nomeação de duas figuras do alto escalão de seu governo – uma delas seria o futuro secretário de Saúde (cargo correspondente ao de ministro no Brasil). Ambas se viram forçadas a recusar os convites depois que se soube que tinham pendências de impostos com o governo.

No Brasil, não custa lembrar o caso Renan Calheiros, então presidente do Senado acusado de corrupção e sonegação de impostos... Ele perdeu a presidência, mas preservou o mandato. E foi decisivo para eleger Sarney presidente da Casa agora.

“Geopolítica”
Seria só impressão ou às vezes parece que políticos em outras partes do mundo têm um senso de moralidade maior do que no Brasil?

Em tempo: o termo geopolítica aparece entre aspas porque foi usado de forma irônica, não no seu sentido literal.

“Santos políticos”
Algumas situações lembram a história de um ex- secretário da Indústria e Comércio de São Paulo, Otávio Ceccato. Acuado por acusações de corrupção nas vésperas de tomar posse no cargo em 1988, ele assim rebateu as denúncias, conforme reportagem da revista “Veja”: “Como São Pedro, nego, nego, nego”.

Como se sabe, são Pedro negou o que era verdade...

domingo, 1 de fevereiro de 2009 | | 0 comentários

As visões da crise

Desde que a crise financeira mundial tornou-se também econômica, em meados de outubro, a palavra "crise" passou a dominar o noticiário. Natural, afinal a função da imprensa é tratar dos principais assuntos do dia. Houve, porém, quem visse a imprensa - o que não é raro - como a vilã dessa história ou, indo além, como a inventora da tal crise.

Alguns amigos, em tom de brincadeira (e provocação), já manifestaram esse pensamento para mim.

Curiosamente, a propalada crise trouxe junto a manifestação de oportunidade. Assim, várias foram as propagandas na virada do ano que buscaram e ainda buscam transmitir otimismo.

Creio, sinceramente, que uma boa dose de equilíbrio é fundamental. A crise não é o fim do mundo e tampouco é a "marolinha" propalada pelo presidente Lula. Em Limeira, centenas de trabalhadores perderam seus empregos (notadamente no setor automotivo, um dos mais influentes na economia da cidade) como reflexo da crise. O Poder Público acaba de anunciar um corte de 10% no orçamento de 2009 - o que significa R$ 44 milhões.

Naturalmente, há setores e pessoas ganhando com a crise. Não se pode ignorar, porém, que em alguns ramos a situação é delicada. Lendo anteontem uma matéria no "Los Angeles Times", por exemplo, deparei-me com um número chocante: "Para onde foram todos os empregos? 200.000 demissões anunciadas só em 2009 (nos EUA)".

Ser otimista é importante, mas não se pode deixar que o otimismo impeça-nos de ver a realidade. Pois é o diagnóstico o primeiro passo para a cura. Assim, enxergar com nitidez o que está ocorrendo na economia mundial é essencial para, efetivamente, buscar na crise as oportunidades necessárias. É mais ou menos o que disse uma propaganda que eu li ontem:

"O pior efeito de qualquer crise é o pessimismo. Ele barra novos investimentos, impede contratações, traz incertezas, tudo que só faz a situação ficar ainda pior. E ser otimista, em um momento assim, não significa ser irresponsável. Significa conhecer a própria força e competência para superar as dificuldades, além de colocar tudo isso em prática. (...) Estamos fazendo a nossa parte. Acreditando que a crise fica menor quando a gente trabalha mais e reclama menos."

Acho que é por aí. Só não podemos nos esquecer que o texto é de uma propaganda. E entre o que se pretende mostrar e o que de fato se está praticando muitas vezes vai uma longa distância...

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Para refletir

Sou um tanto fascinado por frases. Seja as que eu digo, as que eu escuto ou as que leio. Nos últimos dias, tenho lido algumas interessantes. A seguir, reproduzo três delas por ordem decrescente de valor, segundo meu julgamento:

"Todos os dias, faço a escolha de me lançar na vida."
Tom Cruise ("Folha de S. Paulo", Ilustrada, 1/2/2009)

"O que eu acho é: arrisque-se ou vá para casa. Ou então, arrisque-se e seja mandado para casa."
(Idem)

"Life can take you anywhere and everywhere."
(Frase vista no Confort Franca Hotel. Ela seguia com um complemento publicitário: "Fortunetely we have hotels in both locations.")

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"Não é tsunami, há culpados"

"Tudo bem que usar a palavra "tsunami" para descrever a crise econômica pode ser uma maneira eventualmente útil de reforçar o verbo nestes tempos de tanta cacofonia que é preciso gritar para ser ouvido.

Mas carrega o risco de dar a entender que a crise, como o tsunami, é um fenômeno natural pelo qual ninguém é culpado, a não ser a natureza ou Deus, de acordo com a crença de cada qual.

Não é assim. A crise tem culpados que deveriam estar sendo ansiosamente procurados, o que não ocorre. Como tampouco ocorre o mais leve sinal de mea culpa de parte dos responsáveis.

É possível que, nesta altura do jogo, seja mais importante retirar a bala do peito da vítima do que procurar quem disparou. Ok. Mas deixar de fazê-lo cria dois riscos: o de que o atirador continue disparando enquanto a vítima sangra e/ou o de que volte a fazê-lo tão logo seja domada a crise.

Do meu ponto de vista, a crise é produto da deificação do mercado, como onipotente, onisciente e, portanto, infalível. Como disse na posse o presidente Barack Obama, que não pode ser acusado de antimercado, o livre mercado é ótimo para criar riquezas, mas precisa de um "olho vigilante" para evitar seus abusos.

Nas condições atuais de temperatura e pressão, esse olho vigilante tem necessariamente que ser global, o que não é uma fenomenal descoberta minha, mas uma pregação reiterada de parte de líderes como Gordon Brown e Angela Merkel, que tampouco podem ser acusados de comunistas.

Trata-se na essência de uma questão política, não econômica. E a pergunta seguinte inevitável é esta: dispõe o mundo de líderes suficientemente corajosos para pôr um olho vigilante no até agora onipotente mercado e suficientemente competentes para que o olho não seja vesgo ou míope?"

Clóvis Rossi, "Folha de S. Paulo", 1/2/2009