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segunda-feira, 10 de agosto de 2015 | | 0 comentários

Limeira e a história do trabalho

A longa transição da economia brasileira de um modelo escravagista para a abolição criou situações inesperadas aos próprios europeus que, por anos, haviam financiado e lucrado com o tráfico de africanos para as Américas: o surgimento de “escravos brancos” nos cafezais brasileiros.

Documentos dos arquivos diplomáticos suíços obtidos pelo "Estado" revelam que milhares de imigrantes que chegaram ao Brasil para trabalhar nas fazendas de café acabaram se transformando, na opinião de seus governos, em “escravos”. Os casos abriram uma crise diplomática entre a Suíça e o imperador d. Pedro II, além de revoltas em algumas fazendas e a emissão de um decreto no país alpino proibindo os suíços de emigrarem para o Brasil.

A situação, porém, não foi criada apenas pelos fazendeiros brasileiros, mas também pelos governos locais na Suíça, que levaram milhares de pessoas a optar pela emigração como forma de resolver os problemas internos de pobreza que sofriam as regiões rurais do país. Para isso, fizeram empréstimos a idosos, crianças órfãs e até para cegos que, com seu trabalho no “Novo Mundo”, teriam como quitar as dívidas.

O centro da crise foi o sistema de parceria promovido pelo senador Nicolau Pereira de Campos Vergueiro. Diante da decisão do Reino Unido de proibir o comércio de escravos entre a África e a América em 1845, o preço dos escravos africanos explodiu e passou-se a buscar alternativas. Uma delas foi o sistema criado na Fazenda Ibicaba, em Limeira (SP), em que europeus foram convidados a se mudar ao Brasil para trabalhar. Eram os colonos. (...)

Fonte: Jamil Chade, "Nos cafezais paulistas, os 'escravos brancos'", O Estado de S. Paulo, Economia, 10/8/15.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011 | | 0 comentários

Limeira e a coxinha

Feita com carne de frango ou galinha, envolvida em massa, passada na farinha e dourada em óleo quente, a coxinha é unanimidade nacional. Já deveria ter sido internacionalizada, para o mundo descobrir o que sabemos: quando bem preparada, supera em sedução o bolinho de bacalhau, o pastel, o quibe, a esfiha, etc. Mas, apesar de consumida por milhões de fregueses de padarias, bares e estabelecimentos afins, não há consenso em torno dela.

A coxinha creme, ou seja, a feita com a coxa inteira, deve incluir a sobrecoxa para virar refeição completa? E a que chamamos apenas coxinha, à base de carne desfiada ou picada na faca, pode incorporar esse ingrediente moído? A massa leva só farinha de trigo e de rosca ou comporta a batata? Aceita-se uma camada interna de Catupiry, para o queijo "vazar queixo abaixo", na opinião divertida do jornalista Humberto Werneck, ou esse ingrediente é herético?

Outra discussão envolve a origem da coxinha. Velhas padarias, bares e confeitarias de São Paulo e do Rio de Janeiro disputam sua primazia, mas não comprovam o feito. Ultimamente, espalha-se a lenda de que a receita surgiu em Limeira, a 154 quilômetros da capital paulista. Diz-se que um dos filhos da princesa d. Isabel viveu certo tempo em uma fazenda do município, no final do século 19. Era mantido longe da corte por deficiência mental. Enjoado à mesa, só comia coxas de galinha, fritas de maneira simples, ou seja, sem empanar. Não havia ave que chegasse.

Um dia a cozinheira desfiou toda a carne de um frango, dividiu-a em porções, envolveu-a em massa, moldando-a no formato de pera e depois a fritou. O rapaz adorou! Sua mãe aprovou a novidade quando visitou Limeira em 1886. A versão foi contada por Maria Nadir Galante Cavazin no simpático livro Histórias e Receitas - Sabor, Tradição, Arte, Vida e Magia (Sociedade Pró-Memória de Limeira, 2000). Entretanto, não passa de ficção. Todos os filhos da princesa d. Isabel moravam com ela no Rio de Janeiro e eram saudáveis.

A herdeira do trono do Brasil devia conhecer a coxinha, que pode ter aportado no País em 1808, quando sua trisavó, a rainha d. Maria I, e seu bisavô, o príncipe regente d. João, escaparam das tropas de Napoleão e e instalaram o governo lusitano no Brasil. "A origem da receita é claramente francesa", assegura em São Paulo o chef Laurent Suaudeau. Sua afirmação se apoia na obra do chef Antonin Carême (1784-1833). Nas páginas 268, 269 e 270 do livro L"Art de la Cuisine Française au XIXème Siécle - Traité des Entrées Chaudes (Dentu, Librairie, Palais-Royal, Galerie d"Orléans, Paris, 1844), o maior cozinheiro de todos os tempos chama a coxinha de "croquette de poulet" (croquete de frango) e aconselha moldá-la "em forme de poires" (no formato de peras). "Obviamente, a receita foi modificada no Brasil", diz Laurent. "Mas, do ponto de vista técnico, é a mesma."

A coxinha parece ter estreado em Portugal na corte de d. Maria I (1734-1816), a rainha lá conhecida como "a Piedosa" e aqui, como a vimos desembarcar demente, por "a Louca". Quando ainda tinha equilíbrio mental, era uma mulher inteligente, educada, culta e requintada, que apreciava literatura, música, pintura, decoração e sabia comer bem. Para cuidar da sua cozinha, contratou os serviços do chef francês Lucas Rigaud, um profissional qualificado que se exercitara em Paris, Londres, Turim, Nápoles e Madri.

Ele publicou em 1780, na capital portuguesa, o livro Cozinheiro Moderno ou Nova Arte de Cozinha, reeditado em 1999 pela Colares Editora, de Sintra, Portugal. Nas páginas 107 e 108 da última edição há a receita de "coxas de frangas ou galinhas novas". Desossam-se 10 ou 12 aves, conservando a pele, e se recheia com um "picado fino". Mergulha-se no béchamel (molho branco) ligado com gemas. Fecha-se com barbante, passa-se em ovos batidos, pão ralado fino e frita-se em banha. Qualquer semelhança com a coxinha brasileira não é mera coincidência.

Fonte: Dias Lopes, “Da bagagem real para o boteco”, O Estado de S. Paulo, Paladar, 11/8/11.

domingo, 8 de agosto de 2010 | | 0 comentários

Umberto Eco e os livros

Li hoje, com muito atraso, uma entrevista publicada em março no caderno “Sabático”, do jornal “O Estado de S. Paulo”, com o semiólogo, ensaísta e escritor italiano Umberto Eco, autor do famoso “O Nome da Rosa”. Ele fala sobre sua mais recente obra, “Não Contem Com o Fim do Livro”, lançado no Brasil pela Editora Record.

Na obra, Eco e o colega roteirista e escritor francês Jean-Claude Charrière discutem o que parece ter virado um dilema dos tempos modernos: afinal, a tecnologia vai acabar com os livros (e por extensão com os jornais)?

Da entrevista publicada pelo “Estadão”, reproduzo a primeira – e principal – pergunta e também o vídeo disponibilizado pelo jornal:

- O livro não está condenado, como apregoam os adoradores das novas tecnologias?
Eco - O desaparecimento do livro é uma obsessão de jornalistas, que me perguntam isso há 15 anos. Mesmo eu tendo escrito um artigo sobre o tema, continua o questionamento. O livro, para mim, é como uma colher, um machado, uma tesoura, esse tipo de objeto que, uma vez inventado, não muda jamais. Continua o mesmo e é difícil de ser substituído. O livro ainda é o meio mais fácil de transportar informação. Os eletrônicos chegaram, mas percebemos que sua vida útil não passa de dez anos. Afinal, ciência significa fazer novas experiências. Assim, quem poderia afirmar, anos atrás, que não teríamos hoje computadores capazes de ler os antigos disquetes? E que, ao contrário, temos livros que sobrevivem há mais de cinco séculos? Conversei recentemente com o diretor da Biblioteca Nacional de Paris, que me disse ter escaneado praticamente todo o seu acervo, mas manteve o original em papel, como medida de segurança.



Para ler a entrevista na íntegra, clique
aqui. Para ler a resenha sobre o livro, assinada pelo jornalista A. P. Quartim de Moraes, clique aqui.

Ainda sobre o assunto, não deixe de ler uma reportagem do UOL sobre o debate a esse respeito ocorrido na Flip 2010, a Feira Literária Internacional de Paraty, reunindo os historiadores Robert Darnton e Peter Burke (clique aqui). E tem ainda, sobre o mesmo assunto, uma reportagem da Agência Brasil (leia aqui).

quinta-feira, 10 de junho de 2010 | | 0 comentários

A infografia na imprensa

As recentes reformas gráficas e editoriais dos jornais “O Estado de S. Paulo” e “Folha de S. Paulo” acentuaram o valor que as imagens e os infográficos passaram a ter na mídia impressa. Não que estes recursos sejam novos; apenas busca-se valorizar novas formas - mais práticas e didáticas - de contar histórias e/ou dar informações.

No feriado prolongado de Corpus Christi, por exemplo, no lugar de consumir dezenas de linhas para abordar o trânsito nas rodovias, a “Folha” optou por um infográfico informando horários, pontos de lentidão e obras nas principais estradas do país. Funcionou melhor.

Recorrer aos infográficos, porém, exige mais do que conhecimento técnico, como se vê na participação do infografista espanhol Alberto Cairo no Seminário Internacional de Jornalismo Online, ocorrido recentemente em São Paulo. Como ele destaca, mais do que a técnica, fazer um infográfico exige informação precisa.

domingo, 23 de maio de 2010 | | 2 comentários

"Novos" jornais, "novo" jornalismo (?)

Não é o jornal do futuro. Falar em jornal do futuro é estratégia de marketing. A reformulação gráfica e editorial apresentada pela “Folha de S. Paulo” neste domingo (23/5) é, no máximo, o jornal do presente. E com certo atraso, como diz uma jornalista no documentário sobre as mudanças no jornal, lembrando o “velho” Frias. Fosse esta a fórmula do jornal do futuro e o futuro dos jornais não seria tão incerto como é – e a crise dos veículos impressos não seria tão grave como se mostra.

Isto posto (e não é pouco), vamos à análise: a “Folha” tenta, com sua mais recente reforma, ajustar-se aos novos tempos. Por isso, a reformulação me soou mais bem sucedida no campo conceitual do que propriamente gráfico.

Sobre as mudanças gráficas especificamente, recomendo a leitura da postagem feita pelo estudante de Jornalismo, Carlos Giannoni, no blog “O que rola na mídia” (clique aqui). Destaco apenas a mudança positiva do caderno de esportes (um modelo que, aliás, propus quando era editor-chefe do “Jornal de Limeira”, e que não foi implantada).

Nesta postagem, vou ater-me à questão conceitual. Quando “O Estado de S. Paulo” apresentou sua reforma gráfica recentemente, observei uma mudança drástica de conceito. Dos jornais de São Paulo, o “Estadão” foi o primeiro a radicalizar o fim do “hard news” e a aposta em reportagens de maior fôlego, descritivas, interpretativas e/ou analíticas. Via de regra, o “hard news” foi relegado às notas, presentes em todas as editorias, e ao site do jornal.

A reforma do “Estadão” também prenunciou algo que se confirmou com a da “Folha”: a valorização gráfica e editorial da opinião e análise (leia mais aqui). Do mesmo modo, “Estadão” e “Folha” acentuaram a busca da convergência entre mídia impressa e eletrônica. E apostaram com maior afinco no material exclusivo (seja um “furo” ou uma história de vida – que, aliás, ganhou uma seção na estreia da nova diagramação da “Folha”).

De modo diferente, os dois jornais optaram por um texto mais enxuto. No “Estadão”, isso se deu com as notas; foram mantidos textos longos nas reportagens principais de cada editoria. Na “Folha”, até mesmo as reportagens principais sofreram o impacto dos textos mais curtos; o que vale agora é o conjunto editorial (os complementos).

Ainda assim, nenhum deles aderiu – e isto é extremamente positivo e relevante – à “ditadura” dos textos curtos como única saída para os jornais, algo que se pretendeu tornar regra anos atrás.

A grande reportagem tradicional, na “Folha”, ficou reservada ao “Ilustríssima”, novo caderno que substitui o “Mais!” – aliás, a estreia abordando a questão do crack merece leitura. No “Estadão”, ela aparece eventualmente nas diversas editorias (aqui é importante registrar o “eventualmente”, pois a edição de estreia de um projeto gráfico costuma ser mais caprichada. É preciso, portanto, ver como esse projeto vai se desenvolver com o decorrer dos dias).

Cada um a seu modo e mantendo suas características e tradições, “Folha” e “Estadão” buscam com as recentes reformas responder às demandas e aos desafios dos novos tempos do jornalismo. Se as respostas serão bem sucedidas e quanto tempo elas vão durar, só o futuro saberá responder.

Em tempo: em que pese a mídia impressa ter mais perguntas do que respostas, o documentário institucional sobre o processo da reforma da “Folha” é uma aula de jornalismo em seu grau mais concreto – a concepção de um jornal de verdade. Vale a pena!



PS: para comparar com o projeto gráfico de 2006 da "Folha", clique aqui.