Na última segunda-feira, dia
Jamais diria uma sandice destas.
(...) Quando saiu a
publicação, fiquei surpreso porque se confundiu deliberadamente mediação com
negociação, e não foi feita referência aos diversos temas e propostas que
estavam sendo discutidos. Fui vítima do sensacionalismo do título que terminou
desconstruindo totalmente minha fala a ponto de quase ninguém ler o que estava
sendo dito na entrevista.
Afora as implicações éticas,
é interessante notar o processo social que este tipo de jornalismo suscita.
Após a publicação da
entrevista, o site da Folha publicou mais de 400 comentários de internautas
que, além de ameaças, adjetivos e palavrões, muito pouco se debruçavam sobre o
texto da entrevista.
(...) Será este é o público
que estamos informando para debater temas de segurança pública? Estamos
condenados às trevas da truculência e ameaças ao tentar discutir soluções mais
além das corporações ou dos eventos episódicos?
O que eu não havia me dado
conta ainda é o quanto nossa imprensa contribui para esse nível de debate.
Sempre soube que ela era
parte importante do problema de segurança pública, pois não reflete de forma
mais arguta sobre os graves problemas estruturais que vivemos no Brasil. Se
tomarmos os recentes eventos de São Paulo, por exemplo, ainda não vi uma
matéria que busque compreender as raízes mais profundas da crise ou a real
dimensão dela.
Nossa estrutura de segurança
pública é disfuncional, pouco efetiva, bastante descrita na imprensa - mas
raramente analisada. Abdica-se da investigação jornalística para lançar mão de
"especialistas", autoridades e denúncias na busca de
"furos" e manchetes de efeito efêmeras, mas com consequências
perversas na construção de nossa cidadania incompleta.
Eis um setor da administração
pública que se beneficiou pouco com a democratização brasileira: a segurança
pública. Ela ainda é isolada, pouco transparente, avessa a debates e sem nenhum
sentido de prestação de contas acerca do que fazem.
Se por um lado a imprensa
teve o importante papel de denunciar suas mazelas, acabou sendo contaminada
pelo espetáculo e sensacionalismo de nossas misérias cotidianas.
Nós,
"especialistas", terminamos sendo algumas vezes vítimas
involuntárias. Expostos de forma desnecessária, através de fotos e manchetes
que desconstroem completamente o conteúdo do que dizemos em favor do
espetáculo, acabamos alvos da irracionalidade e ira reinantes. (...)
Fonte: Claudio Beato, “Folha de S. Paulo”, Opinião, Tendências/Debates, 22/11/12, p. 3.
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