Deixar a presidência da
entidade máxima do futebol no Brasil a dois anos da realização da Copa do Mundo
no país não estava nos planos de Ricardo Teixeira. O mandato do até então mais
poderoso cartola do esporte que é a paixão nacional só terminaria em 2015. Mas
sua saída acabou sendo antecipada graças ao trabalho jornalístico de uma equipe
de repórteres que ganhou o Grande Prêmio Esso de Jornalismo de 2012, anunciado
na semana passada.
Publicada pelo jornal Folha
de S. Paulo no caderno de Esportes, a série "O jogo suspeito e a queda de
Ricardo Teixeira" foi o estopim da crise que levou à renúncia de Ricardo
Teixeira da presidência da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), cargo que
ocupava há 23 anos. Ela conseguiu comprovar o elo entre o ex-presidente da CBF
e a empresa do presidente do Barcelona, a Ailanto, que recebeu R$ 9 milhões do
governo do Distrito Federal para organizar um amistoso da seleção brasileira.
Reportagens da editoria de esportes não levavam a principal premiação do
jornalismo brasileiro desde 1968.
Foram quatro meses de
apuração envolvendo acompanhamento das investigações feitas pela polícia e pelo
Ministério Público, entrevistas e buscas por documentos, trabalho desenvolvido
pelos jornalistas Filipe Coutinho, Julio Wiziack, Leandro Colon, Rodrigo Mattos
e Sérgio Rangel.
“Esta não foi a primeira vez
que o Teixeira esteve envolvido em um caso de suspeita de desvio de verbas.
Porém, pela primeira vez ficou comprovado de forma documental que ele havia
recebido valores - R$ 705 mil - em sua conta relacionados a um jogo da Seleção.
O grande mérito destas reportagens é que a gente conseguiu fazer o caminho do
dinheiro”, explicou Filipe Coutinho. Ele e o repórter Leandro Colon conversaram
sobre o trabalho de apuração da série premiada com o Centro Knight para o
Jornalismo nas Américas.
Segundo eles, paciência e
persistência foram os principais recursos para chegarem à notícia. “Foi um
trabalho duro de convencimento com as fontes, pois o Teixeira era um cara muito
poderoso e havia uma certa resistência. Recebemos muitos 'nãos' nesse período
de apuração. Mais de uma vez tivemos dia e hora marcados pra conseguir um
documento e, na última hora, a fonte refugava. Não foi preciso usar grandes
tecnologias, tabelas de Excel ou coisas do tipo na apuração. Foram só noites
mal dormidas e metodologia de pesquisa, um princípio básico da reportagem”,
revelou Colon.
Se a pauta surgiu a partir
das investigações feitas pelo Ministério Público e pela polícia, ir além dos
dados oficiais foi essencial para o bom resultado da série. “Durante o processo
da ação civil pública, o promotor que cuidava do caso morreu. Então o andamento
ficou mais lento. Por isso foi fundamental uma investigação jornalística.
Mesclamos as informações oficiais com as que recolhemos por conta própria em
cartórios, juntas comerciais, etc. Fomos buscando o nosso próprio
caminho", contou Coutinho.
Não faltou faro jornalístico
para isso. De uma mera fofoca de pessoas ligadas ao futebol, os jornalistas
conseguiram uma revelação. Após ouvir dizer que o Teixeira estava de malas
prontas para se mudar para Miami, eles checaram o site da junta comercial da
cidade e descobriram que o dirigente havia registrado uma empresa cuja sede era
uma mansão. É lá que Teixeira vive desde março deste ano.
Um dos desafios da apuração
foi ouvir e publicar o outro lado, princípio básico do jornalismo. Todos os
envolvidos, procurados diversas vezes, optaram pelo completo silêncio desde o
início da divulgação do caso. Nenhuma reportagem foi desmentida até hoje.
"O que fizemos, já que eles não queriam se explicar, foi usar as
argumentações que a própria Ailanto deu no processo. Mesmo quando eles não
queriam, fazíamos questão de registrar a versão deles", salientou Colon.
Ao todo, 20 reportagens
compuseram a série que conquistou o Esso, disputado este ano por mais de 1300
trabalhos jornalísticos. "Não planejamos ganhar este prêmio. Aliás,
notícia a gente não planeja, encontra. Então o segredo é fazer o seu papel de
jornalista. Na rotina do jornalismo, não é simples você ficar três, quatro
meses correndo atrás de uma mesma coisa. Só deu certo porque foi um trabalho em
equipe e porque os cinco jornalistas envolvidos acreditaram muito na história
até o fim. O Esso foi a recompensa disso", completou Colon.
Fonte: Natalia Mazotte,
"Os bastidores da série de reportagens vencedora do Grande Prêmio Esso deJornalismo 2012", blog Jornalismo nas Américas, Knight Center for
Journalism in the Americas, 20/11/12.
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