quarta-feira, 1 de agosto de 2012 | |

A multiplicação das refeições

Os números impressionam: praticamente todos os alunos de pelo menos dez CIs (Centros Infantis) de Limeira repetiram a refeição servida na merenda praticamente todos os dias em fevereiro deste ano.

Os dados contam de relatórios entregues pelos próprios CIs à Secretaria da Educação. Eles foram apresentados nesta quarta-feira (1/8) pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Câmara Municipal que investiga possíveis irregularidades no contrato de terceirização da merenda escolar na cidade e no fornecimento das refeições.

Vejamos:

CI “Fábio Franco de Oliveira” – 202 alunos, 375 refeições por dia em média
CI “Caroline Pardo Campos Freire” – 154 alunos, 252 refeições por dia em média
CI “José Eduardo Voight Sampaio” – 140 alunos, 250 refeições por dia em média
CI “Lia Maura Mattos Silveira” – 184 alunos, 361 refeições por dia em média
CI “Lucinda Tank Kühl” – 201 alunos, 360 refeições por dia em média

Estão na mesma situação, por exemplo, os CIs “Orlanda Grisi Rocco”, “Prefeito Ary Levy Pereira”, “Stella Regina Furlan” e “Aldo José Kühl”.

Para entender: o que aqui consta como refeição é chamado tecnicamente de cardápio (ou porcionamento). Cada cardápio é constituído de várias refeições: para os CIs (período integral), são quatro; para as Emeis, duas.

Durante a terceirização, caso um aluno do CI comesse uma ou duas refeições, a prefeitura pagava o cardápio completo (como se fossem as quatro). E se repetisse uma refeição (o café, por exemplo), ainda que não desfrutasse das demais, a prefeitura pagava dois cardápios completos.

Se, numa escola com 200 alunos, foram servidos por dia 375 cardápios, em média, isto significa que 93,5% dos estudantes repetiram alguma refeição. Todos os dias praticamente. Os números chamam ainda mais atenção ao se levar em consideração que há bebês nos CIs que não pedem para repetir a refeição, além de estudantes faltosos.

Conforme o relator da CPI, vereador Ronei Costa Martins (PT), um ex-sócio de uma das empresas fornecedoras de merenda afirmou em depoimento que merendeiras eram orientadas a colocar alimentos em quantidade menor para forçar os alunos a repetirem a refeição. Daí resultariam os números apresentados durante a reunião da CPI.

FALHA 
Secretário da Educação de Limeira entre 2005 e abril deste ano, o ex-vereador Antônio Montesano Neto negou irregularidades. “Se as diretoras (das escolas) assinaram que repetiram é porque houve repetição. Se elas assinaram é porque essa comida foi servida”, falou em depoimento à CPI.

Pelas regras da secretaria, as diretoras endossavam - ou não - as planilhas apresentadas pela empresa fornecedora da merenda com a contagem dos cardápios servidos. Daí Montesano afirmar que não houve fraude na contagem porque o controle passava por todas as diretoras, cada uma em sua unidade de ensino. “Mesmo que o secretário quisesse (fraudar), tinha que passar por todas elas”, disse.

Montesano salientou que o pagamento por cardápio (ou seja, de um conjunto de refeições independentemente de quantas vezes o aluno comia) estava previsto no edital da licitação para terceirização da merenda e nos posteriores contratos. Ele admite que a regra pode ter sido falha, mas defendeu a terceirização do serviço. “Podia ter sido discutido melhor (o edital)”, falou à imprensa.

O ex-secretário afirmou desconhecer qualquer eventual ato de corrupção envolvendo a terceirização da merenda. “Desconheço qualquer tipo de pagamento de propina”, afirmou. E repetiu após ser confrontado com um diálogo suspeito que teria tido a participação dele e do prefeito cassado Silvio Félix (PDT), além de uma terceira pessoa: “Não participei e desconheço o pagamento de propina para quem quer que seja”.

PROFETA
Candidato a vereador pelo PDT, Montesano revelou que chegou a questionar o então prefeito a respeito das denúncias de corrupção que surgiram em todo o país envolvendo prefeituras que tinham contrato de terceirização da merenda com o grupo SP Alimentação, caso de Limeira. “Está dando rolo isso, como é que vai ficar?”, teria perguntado ao chefe do Executivo.

De acordo com ele, Félix “também ficou preocupado com isso” e sugeriu uma consulta às diretoras das escolas. O ex-secretário afirmou que a ampla maioria delas defendeu a terceirização.

Montesano mostrou-se tranquilo ao tratar do assunto. “Eu não tenho medo de discutir merenda com ninguém”, falou. E garantiu não estar arrependido de ter participado do governo Félix comandando uma área que virou o centro de um turbilhão político e jurídico - a terceirização, cujo primeiro contrato foi julgado irregular pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE), é alvo de ações judiciais. “Não, não, não me arrependo”, disse. “Sou professor de História, que é ser profeta do passado. Ser profeta do passado é tranquilo”, comparou.

Além de Montesano, também prestaram depoimento nesta quarta-feira a atual secretária da Educação, Araciana Dalfré; o ex-diretor do setor de merenda, Luís Carlos Prada; e a diretora da secretaria para a área de merenda, Sueli Komatsu.

Dona da Le Barom, empresa que vinha fornecendo merenda na cidade, Marisa Bortoletto Ribeiro não compareceu para depor. Em ofício à CPI, ela alegou “motivo de força maior”, sem especificá-lo. E se comprometeu a prestar depoimento após o dia 17.

0 comentários: