quarta-feira, 15 de maio de 2013 | |

Carta aberta à ex-senadora Marina Silva

Digníssima senhora Marina Silva,
Ex-senadora e ex-ministra do Meio Ambiente

Sua história de vida é exemplar. Suas lutas e suas conquistas são louváveis. Seu idealismo é contagiante e promissor. Seu trabalho é frutífero. Isto tudo, porém, não significa que a senhora não cometa erros de avaliação. E, creio, cometeu ao abordar a questão envolvendo o deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP), recém-eleito presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.

A senhora vem dizendo por aí (falou em pelo menos duas ocasiões, terça-feira 14/5 e quarta-feita 15/5) que  Feliciano "está sendo criticado por ser evangélico, e não por suas posições políticas equivocadas". "A gente acaba combatendo preconceito com outro. Porque se ele fosse ateu, eu não gostaria de combater as posições equivocadas dele dizendo que era porque ele era ateu", afirmou.

Cara senadora: o deputado em questão não está sendo criticado por ser evangélico. A senhora está enganada. Feliciano foi alvo de denúncia da Procuradoria-Geral da República ao STF (Supremo Tribunal Federal) requisitando a abertura de inquérito por supostamente ter difamado colegas parlamentares e, tão grave quanto isto, manter como servidores públicos possíveis "fantasmas".

Conforme a denúncia, membros da Catedral do Avivamento (denominação religiosa comandada por Feliciano) em Franca, Ribeirão Preto, São Joaquim da Barra e Orlândia ganham salário como funcionários da Câmara dos Deputados, mas não exercem expediente.

Além disso, o mesmo deputado é processado sob acusação de estelionato. O caso está no STF já que, como parlamentar, Feliciano dispõe de foro privilegiado.

Embora seja verdade que, conforme a Constituição, todo cidadão tem direito ao contraditório (o deputado nega as acusações) e é considerado inocente até o trânsito em julgado de um caso (quando não há mais chance de recursos), tampouco se pode ignorar graves acusações que se apresentam contra um parlamentar cuja missão é representar o povo.

Assim, não se pode dizer que as cíticas a Feliciano se devem à sua condição de evangélico.

Aliás, quando interessa e convém, o deputado usa a condição de pastor a seu favor, acrescentando tal alcunha ao seu nome durante a campanha eleitoral. Quando torna-se alvo de críticas e denúncias, atribui isto a uma perseguição, como se o fato de ser pastor agora se tornasse um "ônus" do ponto de vista político.

Há ainda a questão das manifestações preconceituosas de Feliciano a respeito de negros (a quem chamou de "amaldiçoados" segundo a Bíblia) e homossexuais, cujo mérito considero desnecessário discutir.

Cara senadora: a senhora tem total razão quando defende a laicidade do Estado brasileiro e prega que nenhum cidadão deve ser "julgado" ou criticado por sua posição religiosa. Tampouco, aliás, como estabelece a Constituição em seu artigo 3°, que trata dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, deve-se discriminar alguém por sua origem, raça, sexo, cor, idade ou qualquer outra questão.

Não custa lembrar que está no preâmbulo de nossa Carta Magna que o Estado Democrático deve assegurar "a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos".

Assim, creio que a senhora deveria, neste caso, somar a relevância de sua voz à luta em favor das liberdades e dos direitos das minorias, da justiça e do fim dos preconceitos, como sempre fez, causa que parece-me não se refletir nas palavras e ações do referido deputado.

Sem mais,

Rodrigo Piscitelli
Cidadão brasileiro

PS (acrescentado em 17/5) - Marina diz que não mudou de opinião sobre pastor Feliciano

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