quarta-feira, 15 de junho de 2011 | |

Quincas Borba, Lula e a crise em Campinas

A ascensão do lulismo ao poder – e, por tabela, do Partido dos Trabalhadores – teve um efeito corrosivo para a política brasileira. Ou benéfico, conforme o ponto de vista. Expôs de modo nu e cru a realidade nacional: a de que a conveniência política (umbilicalmente ligada à eleitoral) se sobrepõe à ética e ao interesse público.

Vejamos: nunca antes na história deste país (para usar uma expressão cara ao lulismo) um presidente obteve tanto cacife político junto às massas para mandar às favas as velhas raposas e os viciados modos da República. Contudo, Lula preferiu jogar o jogo (sujo, registre-se) do Planalto Central. Entre usar o respaldo popular para promover reformas estruturais (como a política), optou por ceder aos “300 picaretas” a quem um dia criticou.

Lula e seus asseclas não pecaram pela omissão, que fique claro. Agiram mesmo, nos meandros do poder, nos corredores de Brasília. Assim, defenderam José Sarney (PMDB-AL) e Renan Calheiros (PMDB-AL). Supondo-se enfraquecido pela crise do “mensalão”, criada – e isto é importante dizer – pelos próprios aliados, abriu espaço aos setores mais conservadores da política nacional.

Rapidamente, Lula percebeu que estava aí o caminho da vitória da sua candidata. Somou a isso uma cesta de benesses eleitorais (cujo preço Dilma Rousseff agora paga, lutando para controlar a inflação estimulada pelo antecessor – eis uma “herança maldita”, fina ironia do destino).

Se na soma dos fatores o resultado da conta dos oito anos de governo é sabidamente positivo para o primeiro presidente petista da história do Brasil, isso não significa dizer que erros não foram cometidos. Ao contrário. São justamente os acertos nas áreas econômica e social que expõem ainda mais os desacertos na esfera política.

Lula tinha tudo para mudar as práticas que criticava, mas preferiu aderir a elas. Não só aderiu como cooptou seu partido e aliados a fazerem o mesmo. Foi assim que o PT do Maranhão viu-se forçado a apoiar a candidatura de uma adversária histórica, Roseana Sarney (leia aqui). Não foi de outra forma em Campinas, onde Lula agiu fortemente para que o seu PT entrasse na nau capitaneada pelo médico e ex-deputado federal Hélio de Oliveira Santos (PDT). E o PT entrou com tudo, assumindo não só secretarias, mas participando – com o vice – na chapa vencedora.

E eis que Campinas assiste a um dos maiores escândalos políticos de sua história (se não o maior). O vice-prefeito, do PT, já foi alvo de dois mandados de prisão em menos de um mês e encontra-se foragido. A primeira-dama e ex-chefe de Gabinete é acusada de comandar uma quadrilha. E o prefeito tenta se sustentar na corda bamba (o afastamento dele deve ser votado hoje pela Câmara Municipal) recorrendo – tal qual Lula – à retórica fajuta da perseguição e do golpismo.

Quem te viu, quem te vê... Este é o mesmo PT que atraiu milhões de fieis sonhadores nos anos 1980? Este é o mesmo PT que foi às ruas para afastar um presidente envolvido em negócios não-republicanos (e não estou falando de consultorias milionárias, mas sim de um Fiat Elba...)? Este é o mesmo PT que lutava por valores éticos e justiça social? Definitivamente NÃO!

Nesta quarta-feira, ao ver no site EPTV.com o posicionamento dos vereadores de Campinas a respeito do pedido de afastamento do prefeito, confesso que senti uma mistura – paradoxal - de surpresa e previsibilidade. Vereadores do PT não se manifestaram e, pasmem, o representante do PCdoB no Legislativo campineiro disse que votará contra o afastamento.

Para quem acha pouco, basta acompanhar pelo próprio site da EPTV o tamanho das denúncias de CORRUPÇÃO envolvendo o governo Hélio. Denúncias com fortíssimas evidências que levam até o gabinete do prefeito (ou até a cama dele para ser mais preciso).

Em situações normais de temperatura e pressão, o posicionamento de PT e PCdoB seriam de se espantar. Depois de Lula, porém, não se sabe mais o que é normal.

O que restou se o lulismo destruiu o sonho? O PSOL, talvez.

Ou teremos que entoar Quincas Borda, célebre personagem do genial Machado de Assis: “Ao vencedor, as batatas”.

PS: se o “novo PT” é igual aos que criticava, eis aí o aspecto benéfico citado no início do texto: caíram as máscaras de quem se apresentava como único guardião da moral na política brasileira.

* Em tempo: só para registrar, este blog noticiou a morte do PT (aquele, dos anos 80) no dia 19 de agosto de 2009. A nota de falecimento pode ser lida aqui.

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