Sempre usei como um dos argumentos contra a pena de morte a possibilidade - real e infelizmente não rara - da Justiça cometer um erro e punir, sem chance de volta, um inocente.
Para os que defendem a pena capital como solução para os problemas da violência, recomendo que leiam o depoimento de Ron Keine dado à BBC Brasil e postado no UOL, cujo trecho reproduzo abaixo. O norte-americano enfrentou o corredor da morte nos Estados Unidos e seu relato mostra os riscos da punição máxima num país corrupto como o Brasil:
"Estava viajando com cinco amigos da Califórnia para Michigan para visitar outros amigos. Em um dos Estados por onde passamos, Novo México, fomos presos por homicídio.
A gente não levou muito a sério, fizemos piada. Então eles nos colocaram na cadeia e pensamos: tudo bem, a qualquer momento, vão descobrir quem fez isso.
A gente acreditava na Justiça. Eu achava que a Justiça não cometia erros. Meu Deus, anos depois eu aprendi: tantos erros são cometidos! Há 160 pessoas que, assim como eu, estavam no corredor da morte e descobriu-se que eram inocentes.
Quatro meses depois, nos levaram a julgamento e nos colocaram no corredor da morte.
Estávamos trancados em celas individuais, num grande corredor. Só saíamos dali se o advogado viesse nos visitar. Não tínhamos direito a exercícios nem a banho. Por dois anos eu não tomei banho. Girava a torneira da pia, sentava debaixo dela e deixava a água cair.
No corredor da morte eu fazia uma coisa horrível. Tinha um calendário na parede e ia colocando um x em cada dia. Fiz um círculo bem grande no dia que eu seria executado.
Todos os dias você acorda e pensa: vou morrer em poucos dias. Dói.
Quando vai chegando mais perto da execução, as pessoas ficam perdidas. Não sabem quem são, o que são. Há relatos de pessoas que foram levadas para o local em que seriam mortas e disseram: deixei minha sobremesa na mesa, vou voltar a tempo de comer? Elas ficam desorientadas, nem sabem que vão morrer.
O problema é que muitas dessas pessoas são inocentes. A gente tinha esperança porque sabíamos que não tínhamos feito nada. Mas você está lá, tentando provar que é inocente, e ninguém acredita, porque todo mundo fala isso.
Pensávamos: os promotores cometeram um erro e vão descobrir. Mas meses depois descobrimos que eles não tinham cometido um erro: eles nos incriminaram.
Nove dias antes da minha execução, um homem estava andando na rua e disse que Deus falou a seu coração. Ele foi até a igreja mais próxima e confessou que tinha cometido o assassinato. E só foi assim que saímos.
Ele era um policial e, por isso, não foi condenado à morte. Ficou na prisão por sete anos.
(...) O sistema nos EUA é corrupto. Promotores mentem para matar as pessoas. E se você não tem dinheiro para um bom advogado, você vai morrer. Se você é negro, ou hispânico, não integra júri; se não acredita na pena de morte, não integra o júri. Todas essas leis são contra o pobre.
Sempre que você dá a alguém o poder de matar outra pessoa, ela vai fazer isso. A única forma de acabar com isso é tirar das pessoas o poder de matar. Este poder corrompe. (...)"
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