Em razão do trabalho, fui ao MIS (Museu da Imagem e do Som), na badalada avenida
Europa, em São Paulo, no último dia 23 de janeiro. Eram dez horas da noite quando disse o tradicional
"É com você no estúdio" com o qual encerro minhas entradas ao vivo no
"Jornal da Cultura". Mal me despedi e vi, à direita, uma figura familiar. Os milésimos de segundo que separaram a dúvida da certeza se deveram
unicamente à quase impossibilidade de encontrar tal pessoa naquele momento
e lugar. Mas estava lá: Silvio Félix da Silva.
O ex-prefeito de Limeira chegara naquele momento, meio
perdido, manifestando a intenção de visitar a exposição que celebrou os 20 anos
do "Castelo Rá-Tim-Bum", programa infantil exibido com sucesso pela
TV Cultura. Disse-me que tinha ouvido que a mostra ficaria aberta de madrugada.
Expliquei que isto ocorreria apenas no fim de semana, e não naquela sexta-feira.
Antes, naturalmente, ocorreram tradicionais e educados
cumprimentos, com manifesto espanto de parte a parte pela surpresa do encontro.
O prefeito cassado explicou que tinha acabado de deixar a Assembleia
Legislativa, onde a esposa e ex-primeira-dama Constância dava expediente como
futura deputada-tampão. Como primeira suplente do PDT na eleição de 2010, ela
assumiu no último dia 1° de fevereiro uma vaga no Parlamento estadual no lugar
do então deputado Major Olímpio (PDT) - que tomou posse na Câmara Federal.
Como a posse dos estaduais ocorre apenas em 15 de março,
Limeira voltou a ter, mesmo que por apenas 45 dias e de modo meramente
protocolar, um representante na Assembleia após 16 anos. "Ela está lá no
gabinete dele (Olímpio)", citou Félix.
Foi a deixa para que eu entrasse nos assuntos políticos. Tinha duas curiosidades. A primeira era saber se o prefeito cassado ainda tinha
disposição para permanecer na política. Ele não negou de imediato e com a
veemência que eu imaginava. "Ainda estou filiado ao PDT", respondeu. A saída pela tangente na prática quis dizer que ele não
pensa em "pendurar a chuteira".
Contudo, Félix foi claro ao dizer que sua prioridade
é se defender na Justiça das acusações de improbidade administrativa e
enriquecimento ilícito da família - que levaram à perda de seu mandato na fatídica
e tumultuada noite de 24 de fevereiro de 2012. “Minha maior vitória neste
momento é na Justiça, não na política”, disse.
Félix contou que acabara de vencer um processo envolvendo a
contratação da empresa Prime durante seu governo. Afirmou que há outras ações em que
ainda se defende. Para minha surpresa, reconheceu o papel do Ministério Público
na avalanche que atingiu sua carreira política e, de modo direto, sua vida. “O
Ministério Público fez o papel dele, o meu agora é me defender, é assim que as
coisas têm que ser”, comentou.
O ex-prefeito lembrou, num misto de sobriedade e resignação,
que está inelegível até 2020 em razão da suspensão dos direitos políticos
decorrente da cassação do mandato. Depois disso, resolvidas as pendências
judiciais, disse com bastante cautela que pode até pensar em se candidatar a
algum cargo. É novo, terá apenas 56 anos quando a punição se encerrar.
Minha segunda curiosidade era a que mais me
aguçava. Diante do quadro que se desenhou nos dois dias que durou a sessão de
julgamento pela Câmara Municipal, perguntei a Félix se ele realmente acreditava
que poderia ser absolvido.
Parêntese necessário: a cassação dependia de dez votos de um
total de 14 vereadores, sendo que a base governista, como regra no país, era
maioria no Legislativo, embora esfacelada diante do escândalo político que
envolveu até a prisão da primeira-dama e dos dois filhos do então prefeito na
manhã de 24 de novembro de 2011.
Outro parêntese necessário: a pergunta martelava na minha
cabeça por causa da reação de absoluta decepção do então prefeito diante do voto
de um dos vereadores – Carlos Rossler, um dos dissidentes da base governista na
ocasião. Quinto a votar naquela noite de 24 de fevereiro, Rossler bradou – para
delírio da plateia que lotava o auditório da Câmara Municipal – um sonoro e
histórico “Não!!!” (que significava sim à cassação). Em tese, Félix ainda teria
chances, mas preferiu abandonar o plenário naquele momento, sem esconder seu
inconformismo com o que considerou uma traição, tendo deixado de imediato o
Legislativo sem esperar o resultado final da votação que lhe tirou o comando da
prefeitura.
Não sei exatamente a razão, mas a resposta do ex-prefeito mais uma vez me surpreendeu. “Sim. Eu
achava que teria mais dois votos”, falou. Perguntei se ele se referia ao
então vereador Antônio Braz do Nascimento, o Piuí, peça-chave na cassação. “Sim, e também o Rossler”, acrescentou.
Comentei com Félix que Rossler havia contado à imprensa na
ocasião que, momentos antes da votação, durante breve encontro na sala de
reuniões atrás do plenário, ele havia dado ao então prefeito um sinal de
positivo. Foi, segundo o então vereador, um “truque” para esvaziar uma eventual pressão que poderia ser feita contra ele –
a estratégia parece ter dado certo, já que Félix admitiu que contava com o voto
de Rossler.
O ex-prefeito comentou que a posição de Piuí poderia ser
compreendida diante de suposta ameaça (ou coação) que teria sido feita por
promotores dias antes da sessão de julgamento na Câmara contra o então vereador
governista (que havia, inclusive, votado a favor do prefeito na Comissão Processante
que antecedeu o julgamento da cassação). “Isto está com o
Rodrigo Janot (procurador-geral da República) em Brasília, está sendo investigado”,
contou Félix. “Foi você que denunciou?”, perguntei. “Sim”, respondeu o
ex-prefeito.
Durante os cerca de 15 minutos do inusitado encontro, houve tempo para
comentar a situação de Americana, que também teve o prefeito Diego de Nadai cassado e vive um caos administrativo após nova eleição tampão. Tempo suficiente
para Félix, mais uma vez, de modo surpreendente, elogiar o Ministério Público
de Limeira. “Se em Americana tivesse os promotores de Limeira não tinha
acontecido isso lá”.
***
E como manifestações surpreendentes não faltaram naquela noite no MIS, Félix se despediu dizendo que, "apesar das desavenças", estava muito feliz em me reencontrar...
2 comentários:
Este texto me fez lembrar um do Milton Neves publicado na revista Placar, acho que em 2006 ou 2007. Na oportunidade Milton Neves estava no casamento do jogador Robinho e se sentou em uma das mesas com o Dunga, que naquela oportunidade era o técnico da Seleção Brasileira. O treinador conversou por longo tempo com Milton Neves, que, logo que teve oportunidade, escreveu tudo o que a memória guardou do diálogo e as colocou em um texto que tempo depois foi publicado pela revista. A visão, a memória e o ouvido do jornalista se fortalecem diante de uma situação dessas... Como eu gostaria de ter uma oportunidade assim!!! Quem sabe... rsrsrsrs
Parabéns Rodrigo Piscitelli! Sempre que posso passo por aqui, belo texto, belo blog.
Abraços!
Filipe
Caro Filipe
Grato pela visita e pelas palavras!
Apareça sempre - é um blog amador, mas feito com carinho e critério.
Abs!
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