(...) A novidade é um valor crucial para a modernidade. E,
como qualquer valor, ela se torna um imperativo: renove-se, invente-se a cada
dia. Desconfiamos do conformismo e prezamos o gesto de mudança e de ruptura - "revolucionário"
se torna uma qualidade, mesmo sem saber de qual revolução se trate.
Claro, se a novidade e a mudança são valores, a repetição só
pode ser aflitiva - a continuidade é uma chatice: o que importa nela é a
procura de um ato que empurre o tempo e nossa vida para frente.
(...) Em suma, há culturas (como a nossa) em que o valor supremo é
fazer uma diferença, e outras (como a nossa, antes da modernidade), em que
cumprir o destino é o valor supremo e reviver sempre o mesmo dia poderia ser um
ideal.
O engraçado é que receamos desperdiçar a vida na repetição,
mas também temos nostalgia de um mundo dominado pela repetição, sem a obrigação
angustiante de encontrar um ato transformador - são nossos sonhos de saída do
mundo, de descanso e aposentadorias campestres e praianos, por exemplo. (...)
Fonte: Contardo Calligaris, “Folha de S. Paulo”, Ilustrada, 5/6/14 (íntegra aqui).
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