A vida no interior – por mais que as cidades cresçam – ainda
é capaz de guardar preciosidades que não são vistas nas capitais. Certas
experiências são únicas.
Experimente, por exemplo, acompanhar um jogo de futebol no
meio da torcida. Você de cara vai reparar que o público é outro: nada dos
torcedores profissionais, organizados (incluindo alguns vândalos). Gente simples,
jovens e velhos, pais, filhos, gente que vai ao estádio acima de tudo para se
divertir.
Será que em algum estádio da capital você encontra um senhor
na altura dos seus 70-80 anos, cabelos brancos, pele marcada pelas rugas,
quieto, radinho de pilha colado ao ouvido, boina estilo italiano para espantar
o frio que mal chegou? Ou o senhor que acompanha o jogo com tiradas pouco
engraçadas, tirando sarro (no sentido mais pueril do termo) dos jogadores
adversários, a quem chama de “salário mínimo” ou “juvenil”, quase como quem
conversa com um colega num bar?
Será que na capital os torcedores vão vibrar inocentemente
quando o outro time da cidade tomar um gol? “O Galo está tomando ferro!”, “Ih,
o Galo empatou...”, “O Batatais fez 2 a 1, aí é bão”, “Gol do Galo...”. Assim,
inocentemente, como se contasse ao colega do lado uma notícia importante em
primeira mão.
Será que em algum estádio da capital você verá o torcedor
cobrando, com a mesma inocência com que comemora os gols tomados pelo outro
time da cidade e com a intimidade de quem está lidando com um colega, que os
jogadores do seu time se esforcem? “Vamos gente, vamos jogar!”, “Vamos gente,
vamos pra cima!”
Será que na capital você vai se deparar com piadinhas de
antigamente, com palavras de antigamente, com um jeito todo simples e caipira
de ser e de torcer? Será que na capital você vai ver um senhor brincalhão, depois
de um ataque perigoso do adversário, dizer para um jovem tranquilamente e em
tom de deboche: “Você está secando a gente hein”?
Será que num estádio da capital você encontrará gente de
todo tipo, ricos e pobres, velhos e novos, solteiros e casados, sós e
acompanhados, com calor e com frio, torcendo todos juntos, compartilhando o
prazer do momento, vibrando, sofrendo, mas acima de tudo vivendo pacificamente em
comunidade?
Onde mais o torcedor vai conversar com o gandula ou com o
maqueiro como quem conversa com o vizinho?
Talvez na famosa Rua Javari, na Mooca, ou no campo do
Nacional você encontre cenas parecidas. Mas nada, absolutamente nada vai se
comparar ao estilo único do interior.
***
Infelizmente, os “sábios” que administram nosso esporte deixaram
o futebol interiorano ir para a UTI (num estágio quase irreversível), mas o pouco
que restou ainda tem um charme irresistível.
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