Alain de Botton, em seu clássico “A arte de viajar”, fala de algumas situações que envolvem as viagens de trem, como ouvir a interação entre os passageiros. Esta é, realmente, uma atividade interessante, antropológica até, eu diria.
Numa recente viagem à Itália, como estava sozinho e não havia com quem conversar, pus-me a ouvir. No trajeto de Florença a Milão, quatro jovens discutiam, no que eu pude entender, sobre o futuro do trabalho – e do trabalhador. Achei a discussão interessante porque: 1) dois dos jovens concordavam com um ponto de vista, os outros dois discordavam; 2) compreendi que algumas angústias que nos atormentam são universais.
A grande questão colocada era: qual a garantia de que um jovem hoje encontrará o trabalho que deseja amanhã? Inovações tecnológicas, desemprego, um mercado cada vez mais exigente e competitivo, novas gerações que atendem melhor às habilidades requisitadas..., vários foram os obstáculos apresentados.
Diante de um mundo cheio de incertezas, é inevitável se confrontar com a dúvida: vale a pena investir numa carreira promissora, ainda que não seja a que sonhamos, ou ainda vale mais correr atrás do seu ideal de vida?
Aqueles jovens não encontraram uma resposta. Também não era este o objetivo da conversa.
Um senhor de meia idade que estava ao meu lado, na outra fileira de bancos, ouvindo a conversa (que qualquer um podia ouvir – os italianos não costumam ser muito discretos ao falar...), decidiu se intrometer no assunto. Após pedir licença, soltou a seguinte frase: “E chi garantisce che il lavoro sarà come lo conosciamo oggi?”
Eis a grande questão: e quem garante que o trabalho será como o conhecemos hoje?
A conversa seguiu por todo o trajeto, agora em cinco pessoas. Uma discussão interessante sobre uma questão que diz respeito aos brasileiros e, imagino eu agora, muito mais respeito aos europeus diante da crise que se apresenta naquele continente. Itália, Espanha, Portugal, Grécia, jovens de todos estes lugares enxergam um futuro cada vez mais sem esperança.
Há um medo no ar – e ele se manifestou aberta e claramente dentro daquele vagão de trem.
Em tempo: foi também numa viagem de trem na Itália que ouvi histórias incríveis de um homem que viajava com a família. Pelo que entendi, ele contava ao seu filho – já adulto – como se dera a contratação de um jogador que fez muito sucesso num time da “bota” e também em todo o mundo. Um tal Diego. Diego Maradona.
Sim, aquele homem havia participado diretamente da contratação e do acolhimento na Itália do astro argentino quando este foi jogar no Nápoles.
Encontros e histórias assim só uma viagem pode proporcionar.
Até o próximo destino, então!
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