quarta-feira, 22 de dezembro de 2010 | |

A questão do transporte

No momento em que o vereador Ronei Costa Martins (PT), de Limeira, discute a proposta de reduzir a tarifa do transporte coletivo aos finais de semana e feriados como forma de estimular o lazer e ao mesmo tempo combater a baixa ocupação dos ônibus nesses dias, considero pertinente apresentar uma experiência que registrei numa recente viagem à Itália.

Em países mais desenvolvidos, como os Estados Unidos e os da Europa Ocidental, o transporte público está anos luz à frente do Brasil. Desconheço cidade brasileira – incluindo Curitiba (PR), considerada exemplo – que tenha resolvido o problema do transporte coletivo.


Segundo o arquiteto e urbanista Felipe Penedo, o transporte público exige alguns requisitos para ser considerado de qualidade: 1) pontualidade; 2) conforto; 3) acessibilidade (o que inclui as calçadas de acesso); 4) eficiência (o que inclui informação); e 5) preço justo. Sem algum desses fatores, não se pode considerar um modelo como bem sucedido. O problema é que no Brasil nenhum dos itens funciona!


Os problemas do transporte por aqui começam pelo abandono “criminoso” do sistema ferroviário em favor do rodoviário. O resultado é o que se vê nas estradas e nas cidades – cada vez mais congestionadas. A opção do brasileiro pelo transporte individual e o estímulo dado pelo governo nos últimos anos para a compra de carros e motos só fizeram acentuar os problemas.


As “soluções”, por enquanto, têm se limitado à expansão da malha viária. Resultados paliativos e de curto prazo, quando muito – veja as novas faixas da Marginal Tietê em São Paulo...


No norte da Itália, ao contrário, milhares (talvez milhões) de pessoas diariamente deixam seus carros em casa e optam pelos trens para se deslocar entre cidades próximas ou até distantes. Fazem isso porque encontram no serviço todos os fatores mencionados anteriormente.




Durante toda a viagem, chegava diariamente nas estações de trem, dirigia-me a um terminal de computador e em menos de um minuto comprava a passagem para um destino que, invariavelmente, apresentava várias opções de horários e preços. Só tive problema em uma ocasião, no trajeto direto Firenze-Milão, cujos trens de alta velocidade saíam de hora em hora (havia opções de saída em intervalos menores de tempo, mas com paradas) e estavam lotados nas três primeiras tentativas de compra (9h, 10h e 11h).

Nos trens regionais ou de alta velocidade, o conforto é muito maior do que nos ônibus e aviões. Em alguns deles, o sistema de informação aponta temperatura, velocidade, etc.



Nas estações, os letreiros informam com precisão horário de partida/chegada, eventuais atrasos e o binário correspondente. Simples assim.

Imaginar todas as pessoas que usam os trens na Itália com seus carros nas estradas é lembrar do que vemos diariamente nas rodovias brasileiras...


Nas cidades italianas, o transporte por ônibus também é exemplar. Em Milão e Verona, encontrei pontos com letreiros digitais informando com exatidão a linha e o horário e/ou tempo de chegada do próximo veículo.


Até em Veneza, onde o transporte é feito por barcos, há informações eletrônicas sobre as linhas, com o percurso de cada uma delas, e o tempo para a chegada do próximo vaporeto. Detalhe: o tempo previsto invariavelmente confere com a realidade.


Em Limeira (e em muitas outras cidades brasileiras), nenhum cidadão que desconheça o sistema de transporte saberá onde pegar um ônibus e qual linha poderá levá-lo ao destino pretendido. Isso porque não há informação alguma em qualquer ponto.

O cidadão terá ainda que esperar por muitos minutos (40 ou mais) para pegar um ônibus que chegará provavelmente lotado. Estará num veículo sem conforto, quente, ficará possivelmente em pé e ainda pagará por esse serviço uma tarifa de R$ 2,40 (a do metrô de Milão é um euro – cerca de R$ 2,70 - se comprada isoladamente; para mais de um trajeto há descontos).


Diante deste cenário, alguns dúvidas apresentam-se:


1) é tão difícil assim disponibilizar ao menos informação aos usuários no Brasil (não estou sequer falando de pontualidade, conforto...)?


2) por que a opção prioritária pelas rodovias e o sucateamento do transporte ferroviário?


3) até quando nossos governantes vão optar por medidas paliativas ao invés de atacar o problema de fato?


4) como falar em desenvolvimento quando não conseguimos sequer oferecer um transporte decente para os cidadãos?


PS: em Milão, aliás, carros e bondes convivem tranquila e pacificamente nas mesmas vias.



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