quarta-feira, 2 de dezembro de 2009 | |

"Piratas da fé"

É muito fácil fundar uma igreja no Brasil. No último domingo, esta Folha publicou reportagem em que relatava como três de seus profissionais criaram a Igreja Heliocêntrica do Sagrado EvangÉlio, com custo de R$ 418.

Ninguém seja maluco de participar de igreja de jornalista, mas, ironias à parte, com a sua nova doutrina, Hélio Schwartsman e seus dois "bispos" puderam fazer operações financeiras isentas de IR e IOF.

Pela lei, como qualquer outra, a Igreja Heliocêntrica está dispensada de pagar IPTU (imóveis urbanos), ITR (imóveis rurais), IPVA (veículos) e ISS (serviços). A Constituição concedeu imunidade tributária às igrejas como forma de proteger a liberdade de culto. Na prática, esse princípio vem sendo sistematicamente desvirtuado.

Um dos efeitos históricos dessa distorção, para falar do que importa, foi a consolidação de um novo grupo de milionários da fé, basicamente composto por pastores-empresários e pastores-políticos. Eles se valem do dinheiro obtido por meio da religião (o dízimo, não tributado) para alavancar atividades mercantis que deveriam estar sujeitas ao recolhimento de impostos.

Não há como decidir por princípio se uma igreja é "séria" ou "vigarista". Aos olhos do fiel, a sua igreja será sempre legítima. Para um ateu, todas têm o dom de iludir.

A questão aqui é outra: o pastor pode pregar para (ou enganar) seus fiéis à vontade; só não pode é usar a Bíblia para ludibriar a Constituição. Igrejas não podem ser biombo de práticas comerciais nem a fé pode ser pretexto para atos ilícitos.

Quando alguém extrai lucro de um estacionamento ao lado de um templo e não paga IPTU por isso, temos aí um pequeno delito. Quando o dinheiro dos fiéis está na origem de um conglomerado empresarial que tem como joia da coroa uma TV (concessão pública) avaliada em R$ 2 bilhões, então o problema é bem mais sério. E pior fica quando esses piratas do Senhor se tornam figuras respeitáveis da República com o respaldo do governo.

Fonte: Fernando de Barros e Silva, Folha de S. Paulo, 2.12.09, p. 2.

PS: eis o que eu penso. E está dito! Aliás, as autoridades em Limeira podiam dar uma checada na situação dos "piratas da fé".

3 comentários:

Roxane E. Regly disse...

Não consigo ler a matéria da Folha, por não ser assinante, mas é uma sugestão de pauta que dei umas duas vezes lá no jornal: buscar saber o que é preciso em cada denominação e junto a prefeitura para se abrir uma igreja.

As pessoas que desejam pregar verdadeiramente o evangelho, não é de hoje, são prejudicadas pelos farsantes e vigaristas, e ultimamente, isto tem acontecido com maior intensidade.

Digo isso sempre a quem vem com generalizações acerca de igrejas e pastores: infelizmente, os verdadeiros cristão, que buscam uma só verdade, que é falar de Jesus Cristo como único senhor e salvador, têm que conviver com rotulações vindas por causa dessas verdadeiras quadrilhas, que estorquem dinheiro usando da boa fé, por meio da própria fé e carência do povo brasileiro. São elas que hoje dominam redes de tv, dizendo se "evangélicos", mas eu, como praticante dessa religião, a qual várias gerações anteriores a mim, tanto maternas quanto paternas, sou uma das que dizem que são na verdade ludibriadores e em nada seguem o verdadeiro evangelho de Jesus: amar a Deus, amar o próximo, não ROUBAR, não MENTIR etc.

ótimo texto! :)

Roxane E. Regly disse...

Ahh! E esqueci de dizer, uma das coisas que me fizeram sugerir por vezes a tal da pauta é o fato de Limeira ter um número absurdo de igrejas. Dia desses fui num bairro mais afastado da área central e em um espaço de três quarteirões, encontrei nada menos que uma igreja por esquina (posso jurar!) Se ainda fossem denominações sérias, luteranos, presbiterianos, batistas, nazarenos, eu daria alguma razão, mas para exemplo, aqui próximo de casa, tem uma chamada "O poço de Jacó"... Só por detalhe, o "dono" da igreja chama-se Jacó, a igreja fica em frente ao seu estabelecimento comercial, um depósito de bebidas e ele usa parte do espaço da igreja para guardar seus caminhões, lotados de caixas de cervejas e vinhos. Acreditem se quiser!

Rodrigo Piscitelli disse...

Pois é, cara Roxane, há muitos falsos profetas explorando a fé alheia. Tente emplacar sua pauta. Em tempo: excelentes comentários!