Quando o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo, o mundo parece ter vindo abaixo para uma parcela das pessoas que atuam na área. Já outras saudaram a decisão como uma alforria. Tenho para mim que nenhuma discussão deve ser movida por paixões – é, portanto, com a razão que pretendo analisar a questão.
Partirei do ponto que me parece menos complexo: afirmar que não existem técnicas para a atuação jornalística é desconhecer a profissão. Portanto, já de início elimino o argumento de que o exercício da atividade jornalística não exigiria especialização. Neste ponto, é preciso separar o que é escrever bem do que é escrever uma reportagem. Como diz o dito popular, “uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”.
Isto posto, o que se coloca é: para fazer uso das tais técnicas jornalísticas, é preciso um diploma? Esta é a questão.
Antes de ingressar neste debate, porém, registro minha incompreensão em relação a um outro argumento usado pelos ministros do Supremo para defender o fim da exigência do diploma. Segundo eles, tal exigência feriria a Constituição no que diz respeito ao direito à livre expressão. Ora, em nenhum momento a atividade jornalística impede que qualquer cidadão – repito, qualquer cidadão – manifeste a sua opinião livremente. Todos são livres para fazer manifestos, protestos, escrever para blogs, jornais e revistas e até montar uma publicação na qual possam expressar sua opinião (aliás, a Internet está cada vez mais recheada disso). Isto nada tem a ver com o exercício do jornalismo, a prática da reportagem, etc.
Liberdade de expressão é um princípio constitucional; acesso à informação é um direito do homem. A atividade jornalística em nada restringe esses conceitos. Por mais claro que isso me pareça, não posso imaginar que os ministros do Supremo – a mais alta corte do País – tenham feito tal confusão (em tempo: sempre que participei como testemunha de audiências judiciais envolvendo questões da imprensa, os juízes sempre tiveram dificuldade para entender como se dá no cotidiano a atividade jornalística; um juiz certa vez chegou a me perguntar o que eu fazia como editor, afinal, já que não tinha revisado uma determinada reportagem nem era responsável pela colocação do título).
Resta, portanto, discutir o cerne da questão: é preciso o diploma? Defendo desde sempre a regulamentação de toda atividade profissional. Convivi – e convivo – com colegas de outras áreas, como a publicidade, e sei quanto os aventureiros prejudicam o mercado como um todo, seja no que diz respeito à remuneração, seja no que diz respeito à qualidade do serviço. Não sou, pois, favorável somente à regulamentação da atividade jornalística, como também da publicitária, da gastronômica, etc.
Isto coloca uma outra questão: tal regulamentação se dá somente com a graduação numa faculdade de jornalismo? Sinceramente, creio que não. Pessoalmente, acredito que os profissionais de comunicação deveriam ser graduados em áreas afins, como economia e ciências sociais, e fazer um tipo de especialização posterior em jornalismo. Quem sabe até uma espécie de residência, como na medicina. Este é o formato vigente em muitos países.
Não quero parecer tucano, ficando em cima do muro, mas não posso deixar de registrar que tenho observado com certo apreço várias manifestações - a favor do diploma e contrárias a ele - desde que o STF manifestou sua decisão. Talvez resida justamente nessa discussão que se abriu o aspecto mais saudável desta história. E até que um novo capítulo seja escrito, podemos todos nos considerar de algum modo colegas de profissão...
PS: nesta discussão, recorrer a extremos – como o não formado que é excelente jornalista ou o formado que é uma porcaria – não vale. Estes são exceções, não regra.
* Texto publicado originalmente na revista “Vida Universitária”
terça-feira, 25 de agosto de 2009 | Postado por Rodrigo Piscitelli às 14:35 |
Ter ou não ter, eis a questão...
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