É impossível - repito, em caixa alta, IMPOSSÍVEL - fazer jornalismo de qualidade sem investimento.
A velha lição, esquecida por quase todas as empresas e redações, foi reforçada numa interessante entrevista do editor do "Washington Post", Marty Baron ao jornal "Folha de S. Paulo", publicada em 3/5/15.
Veja algumas pitacos a seguir:
(...) Há um investimento enorme em medir o comportamento do leitor
digital: o que ele lê, o que ignora, quanto tempo gasta por reportagem. Qual
foi a maior surpresa?
Vários clichês foram confirmados. A porcentagem de quem lê
um texto até o final é muito menor do que a gente pensa. Uma típica reportagem
é lida até o final por 1%, 2% dos leitores. Mas há dois lados da moeda. Várias
reportagens longas, bem-feitas, estão entre as mais lidas. Há um enorme número
de gente que gasta muito tempo em narrativas aprofundadas. Não é verdade que
texto longo afaste leitor.
Assuntos popularescos que fazem barulho na internet espantam
o leitor tradicional?
Há um enorme mercado para assuntos sérios. Mas não é porque
são sérios que precisam ser chatos. Na nossa profissão, se a história parecer
interessante demais, tem gente que acha que está sacrificando a seriedade. Mas
contar uma história séria de forma envolvente é um enorme desafio. Essas são as
mais lidas.
(...) Além da tecnologia, o que pode melhorar no jornalismo e na
maneira de contar histórias?
A narrativa mudou muito com a interatividade. O mais
interessante é a integração das ferramentas em um único texto, nos lugares
apropriados, dar o contexto. Se numa reportagem você narra a gafe de um
político ou uma violência policial e tem o vídeo, pode mostrar ali, na hora.
Coloque o gráfico, a cópia do documento para quem quiser se aprofundar. Não
separado, em outro lugar, como acontecia muito no passado. Tem que estar tudo
bem trançado. É para isso que investimos tanto em tecnologia.
(...) Com esses investimentos, como o conteúdo está mudando?
Falei muito de negócios, mas a minha paixão, o que me mantém
nesse meio, são o jornalismo e a reportagem, e temos muito do que nos orgulhar.
O Pulitzer deste ano foi para uma reportagem nossa sobre falhas do Serviço
Secreto - como o nome diz, é secreto, e nossa repórter conseguiu desvendá-lo. As
revelações de Snowden sobre a NSA foram revolucionárias. Temos feito
reportagens sobre pobreza, drogas, saúde mental, temas ainda evitados na mídia
e na sociedade. Gosto do jornalismo que explica o mundo, explica assuntos com
nuances. Tudo o que puder fugir de slogans de políticos, de
comentaristas com frases feitas.