quinta-feira, 10 de abril de 2014 | |

A velha classe média, o iPhone e a "esquerda caviar"

Os protestos de junho de 2013 (aliás, estaríamos esperando junho chegar novamente...?) colocaram em cena uma série de questões, muitas das quais até hoje não foram – e, creio, nunca serão – respondidas.

Quem eram, afinal, os manifestantes? O que queriam além da revogação do aumento das passagens? Qual segmento, interesses e ideais representavam?

Tamanha falta de respostas concretas a estas e outras tantas perguntas inibe qualquer generalização. Não se pode, portanto, falar de um movimento uníssono, mas de um conjunto de movimentos que se uniu sob determinadas condições de temperatura e pressão (para recorrer, de modo metafórico, a uma expressão da química).

Passado o tsunami das ruas, restou um pequeno e barulhento grupo, o dos “black blocs”. Não vou tratar deles aqui, visto que isto já foi feito em outras postagens.

Quero falar de um outro grupo, que certamente está representado entre os “black blocs”, mas não apenas entre eles. Foi assim identificado por um colega de trabalho: “a turma dos rebeldes de iPhone”.

Referia-se àqueles que saíram às ruas gritando palavras de ordem contra o capitalismo, os governos, a mídia capitalista e conservadora, etc etc etc. Um discurso que, por vezes, retrocedia aos anos 1960.

Dito de modo mais direto: uma classe média que não ascendeu socialmente agora, ou seja, não é tal “nova classe média”. Uma velha classe média, que viaja uma vez por ano ao Exterior, frequenta círculos privilegiados da cultura e possui... iPhone – símbolo do capitalismo dos novos tempos.

Quem melhor do que eu definiu essa turma foi João Pereira Coutinho em recente coluna na “Folha de S. Paulo”:

“É precisamente contra este tipo de fenômenos que Rodrigo Constantino escreveu o seu ‘Esquerda Caviar’ (Record, 434 págs.), que começa da melhor forma possível: com a conhecida frase de Nelson Rodrigues de que é mais fácil amar a humanidade do que aqueles que nos estão mais próximos. 

(...) a ‘aldeia midiática’ em que vivemos promove essas hipocrisias éticas: atores e humoristas que almoçam no Savoy - mas depois gostam de exibir em público as suas ‘lindas intenções’ contra o capitalismo que os alimenta.”

É isto: entre o luxo do cotidiano e o lixo das ruas, soa o grito da velha classe média.

E dá-lhe WhatsApp!

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