terça-feira, 24 de dezembro de 2013 | |

Cidade provinciana (?!)

Programas como “Castelo Rá-Tim-Bum”, “Ilha Rá-Tim-Bum”, “Cocoricó” e mais recentemente “Quintal da Cultura” fizeram e fazem sucesso junto ao público infantil, ganharam prêmios nacionais e internacionais e deram à TV Cultura o selo de melhor emissora com programação infantil no país, mas minhas lembranças são um pouco mais antigas. Não, não assisti ao histórico “Vila Sésamo”, sou do tempo do “Bambalalão” (era fã da Gigi).

Depois veio “Munda da Lua” (alô Lucas Silva e Silva!). “Confissões de Adolescente” não vi, preferia mesmo “Mundos Incríveis”, ambos marcaram época – e gerações. Adorava e continuo apreciando o “Repórter Eco”, um dos pioneiros na TV em abordar um tema recorrente hoje em dia, ecologia e sustentabilidade. O “Roda Viva” era – e é – imperdível (lembro de uma entrevista do Sebastião Salgado). Ao “Matéria Prima” assistia com meu irmão, programa comandado por um tal Serginho Groisman (“Fala garoto!”). E a garotada falava livre e democraticamente.

Sonhando ser jornalista, desde pequeno curtia o “Vitrine”, com os bastidores da mídia. O “Grandes Momentos do Esporte” me apresentou nomes e momentos que eu só pude ver pela TV. Pela TV Cultura. Também acompanhava sempre o “60 Minutos”, um telejornal diferente, esteticamente bem acabado, leve e informativo na medida certa, que trazia uma novidade para a época, a figura do vídeo-repórter, hoje comum.

Sem falar no Campeonato Alemão, que começou por lá e revolucionou as transmissões esportivas com as supercâmeras, bem como o “Cartão Verde”, que introduziu nomes hoje consagrados no telejornalismo esportivo – eu vibrava com a conhecida “ranzinzice” do José Trajano.

Tal como eu, creio que milhares de limeirenses cresceram assistindo à TV Cultura. Uma emissora pública, mantida pelos impostos dos paulistas – os de Limeira incluídos. Infelizmente, por uma decisão unilateral da prefeitura, os limeirenses irão pagar para não ver. O governo Paulo Hadich (PSB), como já amplamente divulgado, decidiu tirar o sinal da Cultura para cedê-lo à TV Opinião, de Araras.

Desde já quero registrar que não tenho nenhuma oposição à tal TV ararense. Na democracia, todas as vozes devem ter espaço, ainda mais na mídia televisiva, uma concessão estatal. Não posso, contudo, deixar de engrossar o coro daqueles que lamentaram a infeliz decisão do governo Hadich de tirar o sinal da Cultura.

Não quero nem vou entrar no mérito da avaliação do governo. Até porque há alguns meses estou distante da cidade e tampouco este é o propósito deste artigo. Quero apenas manifestar o que senti e ouvi diante de tal decisão. Deixo claro que escrevo como cidadão. Embora atue como repórter da TV Cultura (com orgulho!), a decisão da prefeitura em nada afeta meu trabalho, visto que a emissora historicamente nunca se pautou pelas amarras do Ibope (e ainda que o fizesse, a medição da audiência não ocorre em Limeira).

Portanto, sinto-me livre para considerar um despropósito inexplicável a decisão de Hadich. Não há motivo técnico que justifique a exclusão de uma emissora com reconhecida programação de qualidade em detrimento do que quer que seja. No pouco tempo em que estou na Cultura, a emissora foi indicada ao Emmy Kids Award 2013 (o Oscar da TV na área infantil) com a série “Pedro & Bianca” e acaba de ganhar mais um prêmio pelo “Repórter Eco” como melhor programa nacional de meio ambiente.

Não sei qual seria a alternativa para abrigar eventualmente novos canais, mas alguma há de existir que não simplesmente a exclusão da Cultura – decisão tomada sem nenhuma discussão com a sociedade, o que não combina com um governo que se pretende transparente e democrático.

Como limeirense que nasceu nesta terra e sente orgulho de carregar o nome da cidade por onde vai (inclusive na TV Cultura), senti-me triste ao ouvir o comentário feito por uma colega de redação após saber da decisão do governo Hadich: “Coisa de cidade provinciana...”. Tive que calar-me. Não queria que minha cidade fosse vista deste modo, mas não há como ser diferente.

Conhecendo o prefeito Hadich, quero crer que tal decisão não tenha passado de um deslize, um desatino. Não creio que o prefeito jogaria no lixo o que lhe restava de popularidade neste primeiro ano de administração - embora tema que este governo possa ter caído na mesma armadilha de tantos outros, a de sobrepor questões políticas ao interesse comum. Falo isto porque sei, de bastidor e fonte segura, há pelo menos dois meses, da intenção da prefeitura de trocar o sinal da Cultura pelo da TV Opinião.

Corrobora tal sensação o fato da TV Opinião não ser conhecida especificamente por sua programação de qualidade, educativa e/ou voltada aos interesses limeirenses. Como também temo haver por trás da intenção desta emissora outras questões além da meramente midiática. Isto tudo somado, chego perto de me decepcionar com o governo. Não simplesmente pela exclusão da Cultura (um fato que seria por si só lamentável), mas por ter fortes indícios do que esconde esta decisão, algo que jogaria Hadich na vala dos comuns, dos políticos comuns (algo que definitivamente não é o que se esperava dele).

Escrevo estas linhas com dor no coração e com a tranquilidade e liberdade de quem falaria (se tivesse a oportunidade) tudo isto diretamente ao prefeito, como o fiz algumas outras vezes sobre outros assuntos, já que sempre pautei minha relação com ele pelo mais estrito respeito e consideração.

Até por isto, ainda espero que Hadich possa refletir melhor, reconhecer o erro e recuar. A humildade é marca dos fortes.

* Artigo enviado para publicação no "Jornal de Limeira"

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