quarta-feira, 3 de julho de 2013 | |

Protestos sem fim: uma crise de representação

Paul Pillar, ex-analista da CIA (Agência Central de Inteligência), fez essa pergunta em ensaio recentemente publicado pela revista "National Interest": por que temos visto tantas revoltas de rua em democracias?

Falando especificamente de Turquia e Brasil, mas propondo uma questão que pode ser aplicada a Egito, Israel, Rússia, Chile e Estados Unidos, Pillar pergunta:

"Os governos contra os quais os protestos estão sendo realizados foram eleitos livre e democraticamente. Já que as urnas estão disponíveis, por que recorrer ao protesto de rua?"

É uma questão importante, e a resposta, acredito, está na convergência de três fenômenos.

O primeiro é a ascensão e proliferação de democracias "majoritárias" e não liberais.

Na Rússia, Turquia e no Egito atual, vemos protestos de rua para contestar partidos "majoritários" --eleitos democraticamente, mas que interpretam a eleição como mandato para fazer o que quer que desejem ao assumir.

Isso inclui ignorar a oposição, sufocar a mídia noticiosa e se comportar de outras maneiras imperiosas ou corruptas, como se a democracia envolvesse apenas o direito de votar, e não os direitos em geral, especialmente os direitos das minorias.

O que os manifestantes na Turquia, Rússia e Egito têm em comum é a sensação de que os eleitos estão roubando algo mais que dinheiro: a voz e o direito das pessoas de participar do governo. Nada pode zangar mais alguém que tenha acabado de conquistar o direito ao voto.

(...) Por fim, graças à proliferação de smartphones, tablets, blogs, Twitter e Facebook, os insatisfeitos agora têm poder muito maior de se envolver em diálogos - e de exigir que seus governantes façam o mesmo. Têm também capacidade ampliada de se juntar a pessoas que compartilhem de suas opiniões.

Como definiu Leon Aron, historiador russo do American Enterprise Institute, "o tempo de giro" entre uma sensação de insatisfação e a ação para remediá-la é muito rápido - e está se acelerando cada vez mais.

O resultado líquido é que a autocracia é menos sustentável do que em qualquer momento do passado.

As democracias são muito mais prevalentes, mas também serão mais instáveis do que no passado. Haverá cada vez mais pessoas na rua, protestando contra mais questões e dotadas de maneiras mais independentes de contar suas histórias em volume cada vez mais alto.

Fonte: Thomas Friedman, tradução de Paulo Migliacci, Governos democráticos enfrentarão cada vez mais protestos”, Folha de S. Paulo, Mundo, 3/7/13.

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