sábado, 6 de outubro de 2012 | |

A memória do jornalismo brasileiro

Há 20 anos, pesquisando na Biblioteca Nacional para um livro que se chamaria "O Anjo Pornográfico", precisei consultar a coleção do "Correio da Manhã" referente ao ano de 1967. A funcionária da seção de periódicos levantou a ficha do jornal e me informou que não dispunham do "Correio" daquele ano - mas que, segundo a ficha, os exemplares seriam "brevemente fornecidos pela Biblioteca do Congresso dos EUA".

Aconteceu que, procurando melhor, descobriu-se que os americanos já haviam fornecido os exemplares, não só de 1967, mas também dos anos imediatamente anteriores, idem em falta - a ficha é que não fora atualizada. Com isso, pude mergulhar na riquíssima coleção daquele jornal fundado em 1901 e morto pelo AI-5 em 1968, mas só sepultado em 1974 e, desde então, ignorado pelos pesquisadores, para os quais só existiu o "Jornal do Brasil".

Bem, agora não há mais desculpa. Fuad Atala e Bertholdo de Castro, colegas dos tempos do "Correio" e guardiães de sua memória, acabam de me mandar um presentaço: o "Correio da Manhã" digitalizado, do primeiro ao último número, pela Biblioteca Nacional (entre em hemerotecadigital.bn.br e escreva o nome do jornal no espaço "Buscar").

Por quase 70 anos, o "Correio da Manhã" abrigou os maiores nomes do jornalismo e da literatura. Ditou normas da imprensa, ajudou a derrubar ministros e presidentes, enfrentou truculentos de vários calibres e influiu decisivamente na vida nacional. Mas pode ser coincidência que seus anos de lacuna na Biblioteca Nacional fossem os de sua maior oposição à ditadura militar.

Lacuna afinal preenchida pelos exemplares da assinatura da antiga Embaixada dos EUA no Rio, cujo endereço impresso se lê ao lado do cabeçalho nesse fabuloso "Correio" digital - pronto para servir de novo à história do Brasil.

Fonte: Ruy Castro, "O 'Correio' digital", Folha de S. Paulo, Opinião, 6/10/12, p. 2.

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