sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011 | |

"Mudanças sem razão"

Esta é uma coluna especial. Escrevo numa etapa bastante importante da minha vida. E, desta vez, vou me dedicar menos aos aspectos da tecnologia e compartilhar com os leitores um momento único e especial de minha carreira profissional.

Nesta semana comecei uma nova etapa. Uma etapa precedida da mais fantástica experiência que alguém pode ter sonhado, liderando a empresa que será sempre referência para outras gerações. Mas, como nosso mundo vive em constante transformações, achei que era a hora de partir para outros desafios.

Mudar sempre é um processo complexo. Principalmente quando envolve organizações tão fascinantes. Novamente escrevo de alguma parte do mundo, fora do Brasil. Reflexo de que realmente o que gosto é do movimento, de coisas novas, de sempre olhar novos horizontes, não importa a altura.

No domingo antes de viajar, uma das minhas filhas me questionou, chorando, por que eu estava saindo de viagem por quase três semanas, se há pouco mais de um mês já havia anunciado que nova viagem apenas em família, no Carnaval.

Expliquei a ela que houve uma mudança importante na minha vida e que era fundamental fazer essa viagem. Obviamente ela não entendeu e praguejou a tal mudança.

Chego ao controle de passaporte nos EUA e o agente me pergunta quais eram os meus planos para aquela semana. Explico que estava chegando para conhecer em profundidade a nova empresa, o Facebook. Ele me pergunta onde trabalhava antes e fuzila: mas por que você saiu de empresa tão boa?

Fiquei pensando quantas vezes mais deveria interpretar os motivos pelos quais as pessoas questionam uma mudança. E concluí também que uma mudança é cercada de variáveis que só quem está mudando pode realmente entender.

Diferentemente do que parece, mudanças acontecem menos por questões racionais e muito mais por questões emocionais. É tão comum perguntas como: mas por que você saiu da empresa tão boa, com tanta gente, todos gostavam de você, as projeções eram tão positivas etc.

Recentemente, duas pessoas muito próximas realizaram mudanças radicais em suas vidas. O primeiro, um senhor de 70 anos, dos quais 68 vividos de maneira absolutamente cosmopolita entre Rio de Janeiro, Nova York e São Paulo.

Durante um final de semana, ao visitar os amigos em uma pequena cidade do interior, volta dizendo que se mudaria imediatamente para a tal cidade. Espanto geral, filhos duvidando. Em menos de dois meses, ele estava instalado na cidade, onde vive há dois anos sem a menor perspectiva de voltar para São Paulo.

A segunda pessoa, uma executiva muito bem-sucedida, que nos últimos dez anos ocupou posição de destaque na área de marketing de uma empresa de cartões de crédito. Há dois meses, leu uma entrevista sobre o projeto Make A Wish e, em pouco mais de duas semanas, mudou completamente o status de executiva de uma multinacional para o de colaboradora de uma instituição sem fins lucrativos.

Admiro muito a coragem que essas pessoas têm de se desprender das questões materiais e tomar decisões baseadas em seus sonhos. Nos casos citados, o processo de mudança está muito mais vinculado ao emocional, ao sentimento do que a uma série de estatísticas racionais.

O senhor que visitou a pequena cidade se encantou com a tranquilidade, sentiu a diferença entre as duas realidades e decidiu mudar. A executiva que leu o texto sobre a instituição de auxílio a crianças enfermas foi tocada por uma sensação de que podia ajudar outras pessoas, fato que acendeu a vontade de mudança.

John Kotter, professor na Harvard Business School, descreve o processo de mudança em três passos: uma pessoa vê algo que a faz sentir-se de uma maneira única e especial e essa sensação resulta no desejo de mudança. É um processo olhar-sentir-mudar.

Num mundo tão dinâmico, é fundamental tratar as novas oportunidades aquém do racional. Mudanças não requerem uma razão. É fundamental enxergar a magia do novo, o desejo de construir, a vontade de impactar. Aqui vamos nós em mais uma jornada emocionante e transformadora.


Fonte: Alexandre Hohagen, “Folha de S. Paulo”, Mercado, 24/2/2011.

0 comentários: