segunda-feira, 22 de dezembro de 2014 | | 0 comentários

São Paulo, entre a opressão e a exuberância

São Paulo é uma cidade que testa a natureza humana. Um lugar de contrastes - capaz de abrigar numa mesma área o luxo frio do Morumbi e a pobreza vibrante de Paraisópolis - não pode passar incólume por ninguém.

Andar pela capital paulista e não se indignar com retratos seguidos e frequentes da mais cruel falta de dignidade humana, exposta como ferida nas suas calçadas e jardins, embaixo de pontes, passarelas e viadutos, homens mulheres e crianças em situação de extrema pobreza ou, o que é mais comum, vencidos pelo vício da bebida e das drogas (com destaque para o crack), é chocante. (Um cenário bem diferente daquele apresentado na propaganda da prefeitura na TV ou citado em recente artigo de um vereador petista da capital).

Neste sentido, São Paulo é uma cidade feia, difícil, dura, que amargura, deprime e entristece todos os que ainda têm a capacidade de sentir.

Ao mesmo tempo, e paradoxalmente, esta mesma cidade abriga as mais pulsantes manifestações artísticas e de criatividade nas mais diversas áreas do conhecimento humano (social, ambiental, arquitetônico, etc). O sangue pulsante do que se define como cidade, ou seja, o lugar do convívio social coletivo e público, passa pelas ruas da capital. Como metrópole que é, recebe gente dos quatro cantos do globo – que vêm para mostrar seu trabalho, sua arte ou simplesmente para passear.

Neste aspecto, São Paulo emana uma energia diferente, comparável à mesma energia que move a vida. Uma energia que contagia, alegra, estimula e desperta a alma e o coração de todos os que ainda têm capacidade de sentir.

Lidar, porém, com estas duas cidades (ou estas duas realidades) misturadas num mesmo ambiente exige um certo distanciamento. Porque por mais que a capital paulista também tenha segregado à periferia o seu lado mais sombrio no que diz respeito à pobreza e à ausência do estado, não existem nela muros capazes de separar estes dois mundos.

E tal como na junção de Paraisópolis com o Morumbi, a região da estação da Luz (onde fica a Sala São Paulo, reduto cultural da elite paulistana) abriga o que há de mais belo e de mais horrendo nas paragens de Piratininga. A arquitetura monumental e histórica da antiga estação Júlio Prestes e do antigo prédio do Deops (Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo), São Paulo é tudo isto, tudo junto e misturado. Um cardápio de tristezas e possibilidades. 

Um lugar falido e que renasce (ou resiste) a cada dia. Uma cidade pela qual todos os que ainda têm a capacidade de sentir simplesmente sentem – a alegria da maior metrópole do hemisfério sul e a mais rica da América Latina e a vergonha das entranhas expostas de um país fadado ao fracasso (e que tenta lutar bravamente contra esse destino).

PS: tive que voltar o tema, mesmo após escrever sobre o lado“A” e o lado “B” de São Paulo em postagens anteriores.

domingo, 21 de dezembro de 2014 | | 0 comentários

O olhar estrangeiro (e a magia do futebol)

Tenho uma certa angústia (aliás, muitas, mas não vem ao caso neste momento) diante da impossibilidade de enxergar o olhar estrangeiro no Brasil. Uma impossibilidade sociológica - nenhum ser humano é capaz de sentir as estranhezas de quem vem de fora em seu próprio país (ou, de modo mais correto talvez, em sua própria cultura).

Recentemente, soube de um livro - "Palavra de Gringo" - escrito por correspondentes estrangeiros a respeito de aspectos pitorescos da cultura e do comportamento brasileiros. Ainda não o li, mas pelas resenhas me pareceu interessante.

Li, contudo, um outro livro (bem interessante, aliás) que me despertou para esta recorrente angústia. Trata-se de "Pelada - Uma volta ao mundo pelo prazer de jogar futebol". Escrito por Gwendolyn Oxenham, ele relata a saga de quatro jovens norte-americanos (a autora incluída) por 25 países em busca de jogos informais de futebol - a chamada "pelada" no Brasil, termo emprestado ao título da obra (provavelmente pelo carinho dos autores pelo "país do futebol").

Nele, a autora cita alguns aspectos curiosos do país, como nos trechos abaixo:


"Cheios de vida" é como Luke descreve os brasileiros. (Ele tem uma teoria não científica de que a incapacidade dos brasileiros de conterem sentimentos e emoções está, de alguma forma, relacionada ao guaraná - o Mountain Dew deles.)" - p. 47

"Nós o seguimos, viramos a esquina e chegamos a um restaurante de comida chinesa (simples assim: somos convidados para jantar por uma pessoa que nunca vimos antes)." - p. 59
 

"A bola caiu na minha frente. Tentei fazer algo sofisticado. Quando se está no Brasil, isso funciona um pouco, seus pés parecem enfeitiçados, fazendo coisas que você não é capaz de fazer, como se você tivesse absorvido um pouco daquela ginga." - p. 77

Da mesma forma, o livro traz aspectos dos demais países visitados.

O objetivo principal da viagem não foi a produção do livro e sim de um documentário, lançado mundialmente em 2013 e premiado.

"Longe dos refletores e dos campos oficiais dos estádios, pulsa um outro lado do futebol: a pelada. Os jogos espontâneos, feitos por e para qualquer um, em qualquer lugar, pelo simples prazer de jogar", como cita a apresentação do trailer oficial na página da editora Zahar (a mesma do livro) no Youtube.



Ou o trailer um pouco mais longo (em inglês) no canal de uma das participantes do projeto, Rebekah Fergusson:



Não sei se o propósito desta postagem foi falar mais a respeito do olhar estrangeiro, uma curiosidade que sempre me move e encanta, ou do "soccer project", o projeto audacioso, mágico e belo dos jovens americanos que deu origem a um documentário e a um livro.

Seja como for, estão aí, numa mesma postagem, os dois registros.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014 | | 0 comentários

Dilma - passado e futuro

Resumo da era Dilma 1.0:

(...) Ao assumir, Mantega encontrou um país que crescia algo mais que 3% ao ano, com a inflação na meta (4,6%) e um superavit de US$ 13 bilhões (1,4% do PIB) nas contas externas. O superavit primário não era maquiado e equivalia a 3% do PIB, enquanto a dívida bruta do governo caíra para 56% do PIB. Naquele momento, o Brasil gerava 1,3 milhão de empregos formais por ano e pavimentava seu caminho para receber o grau de investimento. 

O país que entrega não poderia ser mais diferente. O crescimento neste ano mal deve superar zero, a inflação (6,6% nos últimos 12 meses) segue perigosamente próxima ao teto da meta e o deficit externo supera US$ 84 bilhões (3,7% do PIB) nos 12 meses até outubro.
 

O superavit primário (maquiado) caiu para 0,6% do PIB (sem maquiagem, trata-se de deficit de 0,2% do PIB), e a dívida governamental atingiu 62% do PIB. A geração de empregos formais nesse contexto caiu para pouco menos de 300 mil postos por ano. (...)
 

Fonte: Alexandre Schwartsman, “Uma fotografia na parede”, Folha de S. Paulo, Mercado, 17/12/14.

Desafios da era Dilma 2.0:

(...) 1) Gastar menos do que se dispõe, bidu; 

2) Não esconder dívidas no armário (esqueletos ou caveirinhas), assumir as que estão debaixo do tapete, não maquiar a contabilidade;
 

3) Preços de verdade: tarifas de eletricidade sem subsídios (repassar custos para o consumidor), por exemplo. Aumentar a taxa de juros, a TJLP, dos empréstimos e doações do BNDES a empresas;
 

4) Estimativas realistas de crescimento do PIB e de receita de impostos, de juros ou inflação. Isto é, projeções de mercado, acompanhadas de estimativas paralelas do governo, como de resto o faz o BC;
 

5) Revisar subsídios e desonerações a fim de verificar se os benefícios dessas políticas, no fundo despesas ("gastos tributários"), foram eficazes pelo menos segundo seus objetivos iniciais. Isto é, ainda tem imposto para aumentar, além dos comentados na praça (IPI, Cide, Imposto de Importação, IOF etc.);
 

6) Bancos públicos devem ajustar a concessão de crédito às suas possibilidades e aos riscos maiores de uma economia estagnada, o que de resto é um auxílio ao BC, que talvez assim possa maneirar no juro se a banca estatal maneirar no crédito.
 

7) O que o governo não tem tempo, dinheiro ou capacidade de fazer será feito pelo setor privado. "Deu certo em aeroporto e em certas rodovias. Vai ter disso também em porto, setor de gás, internet". (...)
 

Fonte: Vinicius Torres Freire, “As dores de cair na real”, Folha de S. Paulo, Mercado, 17/12/14.

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Que país é este (e que Justiça é esta)?

Inevitável pensar: se Maluf é ficha-limpa, então tenho licença para matar.

(Pensamento propositalmente exagerado e parcialmente inspirado no título do filme.)

* Leia também:

- Se Paulo Maluf é Ficha Limpa, tudo é permitido

terça-feira, 16 de dezembro de 2014 | | 0 comentários

Trabalhando... (na Suíça para o "Eco")

Série de reportagens gravadas na Suíça para o programa “Repórter Eco”, da TV Cultura (dom., 17h30):

- Qualidade da água (a partir do minuto 1:45):


- Energias renováveis (a partir do minuto 5:10):



- Produtos orgânicos (já no início do bloco):

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014 | | 0 comentários

2014 - um ano definitivo!

Como tenho feito nos últimos anos, eis o balanço (um tanto ainda precipitado, é verdade) deste 2014 que ruma para o fim.

Foi, sem margem para dúvida, um ano acima das expectativas – e definitivo em muitos aspectos.

Raras vezes minha vida sofreu tantas mudanças como neste 2014. Mudanças de alguma forma irreversíveis.

A primeira delas: a decisão de juntar as escovas de dente. Sobre isto não quero me alongar, já que não pretendo – ao fazer uma espécie de balanço público da minha vida (embora, na verdade, seja mesmo uma forma de avaliação e de acertos internos) – tratar de vertente tão íntima. Registro apenas que tem sido uma feliz descoberta, dia a dia, da forma como todas as uniões merecem ser (ou seja, com diálogo, respeito e acima de tudo amor).

Ainda do ponto de vista pessoal, já que comecei por este lado, 2014 me permitiu rever conceitos e tirar conclusões. Reencontrar pessoas e abandonar outras. Permitiu-me, acima de tudo, colocar em prática uma frase ouvida certa vez de uma colega de trabalho, e que me atormenta desde então: “Ryan, você não pode mergulhar assim de coração nas relações...”.

Um ano, este ano!, que trouxe episódios e conflitos (aparentes e invisíveis para certos olhos) que permitiram clarear quem são os amigos legais (cada vez mais raros) e aqueles que são apenas bons companheiros de cerveja. Quem são os capazes de cruzar oceanos e os que apenas dão alguns (poucos) passos. Quem são os que lembram e os que esquecem. Os que jogam limpo e os que escondem.

A vida deu também este ano oportunidades para que as pessoas pudessem se redimir – oportunidades desperdiçadas por corações duros e pela incapacidade de perdoar. Neste aspecto, 2014 foi também um ano de um ponto final definitivo.

Por fim, foi um ano para me aproximar de quem amo e de quem me ama. De valorizar pequenos momentos, um abraço, um afago, um carinho, uma saudade. De saber quem se importa e com quem de fato devo me importar.

Do ponto de vista profissional, foi um ano excepcional. Vivi várias “primeiras vezes” – num Carnaval de São Paulo, numa Copa do Mundo, numa eleição presidencial. Foram quatro viagens internacionais (Canadá, Peru, Suíça e Suécia), que renderam dezenas de reportagens – todas expostas neste blog e no Piscitas – travel & fun.

Um ano em que aprendi muito, aquietei-me e simplesmente vivi, ou deixei a vida me levar (mas também fiz acontecer – as viagens são prova mais evidente disto).

De 2014, portanto, carrego boas lembranças. Um ano que, talvez, sob certos aspectos, não mais se repita. Que seja: que os próximos tragam seus próprios desafios – e que eu encontre sabedoria, discernimento, humildade, força, amor e fé para dar os passos que precisam ser dados, sempre avante!

Obrigado a todos que compartilharam momentos nesta caminhada de 2014!

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O caminho (fácil) para a audiência (3)

Mais de seis décadas depois da estreia de "A Montanha dos Sete Abutres" (1951), é interessante ver como várias das "lições" de Chuck Tatum, o jornalista decadente e picareta vivido por Kirk Douglas, permanecem atuais.

(...) Mas o incidente diz muito do estado de ansiedade dos executivos de televisão com os novos hábitos dos espectadores. Diante das muitas possibilidades de gravação de programas e de TV à la carte, o desafio de manter o público na frente da televisão, vendo a programação e os anúncios que as emissoras querem, exige muita criatividade. O perigo é recorrer a ideias de homens como Chuck Tatum.

Fonte: Mauricio Stycer,
“Acobra não engoliu o homem”, Folha de S. Paulo, Ilustrada, 14/12/14.

Leia também:


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O mundo de Mafalda

Está em cartaz na Praça das Artes, no Centro de São Paulo, a exposição que comemora os 50 anos de vida de uma argentininha arretada. "O mundo segundo Mafalda" traz, de modo lúdico e divertido, um pouco da vida e das visões de mundos (literalmente) da mais conhecida personagem do cartunista argentino Joaquín Salvador Lavado - o Quino.


 
 



 

“Mafalda nasceu em tempos duros e sombrios, mas com sua postura inquieta e questionadora, a personagem (...) pôde driblar essa atmosfera e trazer à tona, ora de forma indignada, ora de forma divertida, perguntas que foram capazes de iluminar novos caminhos e apontar para outra direção”, anotou o secretário municipal de Cultura, Juca Ferreira.





"Que velha e que jovem é!
Que pequena e que grande é!
Que simples e que complexa é!
Que doce e que incisiva é!
Mafalda somos todos nós"
(do folder da mostra)

 
 

 
 
 





 A Praça das Artes fica na avenida São João, 281. A exposição vai até 28 de fevereiro, das 9 às 20h.

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"Bolsonaro somos nós"

(...) Achamos que tudo aqui termina em suaves consensos. Minimizamos a escravidão e continuamos racistas. Legitimamos as ditaduras e permanecemos entusiastas das torturas cometidas diariamente no país.

Ao defender o regime militar, nas ruas ou covardemente na internet, os Bolsonaros dão seu apoio à tortura. Não é tácito, é explícito, pois não há meio termo nesse assunto. (...)

Fonte: Luiz Fernando Vianna, “Folha de S. Paulo”, Opinião, 12/12/14, p. 2 (íntegra
aqui).

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Frase

“Fugir do passado não o modifica.
Clóvis Rossi, jornalista, em artigo na "Folha de S. Paulo"

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014 | | 0 comentários

As vozes israelenses contra a ocupação

Conheci recentemente – por meio da revista “Ocas” – o trabalho da “Breaking the Silence” ("Quebrando o Silêncio"), uma organização não-governamental de Israel formada por ex-soldados (lá o serviço militar é obrigatório para homens e mulheres) que busca o fim da ocupação israelense em territórios palestinos por meio de denúncias dos abusos cometidos pela Força de Defesa de Israel.

Denúncias nesse sentido são comuns. O que diferencia o trabalho da ONG é o fato dela ser formada justamente por ex-militares, ou seja, as denúncias partem exatamente de quem praticava os abusos (e não pretendo aqui fazer nenhuma reflexão, para isto recomendo a leitura da revista ou um contato com o site da ONG).

As denúncias são registradas em vídeo e áudio e constam basicamente de relatos de soldados e ex-soldados israelenses. Já são quase mil depoimentos, como o do vídeo abaixo:


A seguir, transcrevo um trecho da entrevista concedida à “Ocas” pelo diretor da organização, Yehuda Shaul, de 31 anos, em reportagem assinada por Douglas Portari, da Fundação Perseu Abramo:

“Eu nunca invadi casas no meio da noite, arrombando apartamentos, em Jerusalém e, provavelmente, onde você vive a polícia também não faz isso. Mas, em Hebron, onde eu servi por um ano, há duas patrulhas militares e uma patrulha policial de fronteira. Seu trabalho é, no jargão militar, fazer sua presença notada. Você tem essas patrulhas 24 horas por dia, sete dias por semana. 
Você começa seu turno às 22h e vai até 6h. Caminha pelas ruas da velha cidade de Hebron, tromba com uma casa, uma casa palestina, não uma casa da qual você tenha alguma informação de inteligência [uma suspeita], uma casa qualquer, o sargento é quem a escolhe – eu fui sargento por alguns meses. Entramos, revistamos a família, homens de um lado, mulheres de outro, vasculhamos o lugar, você pode imaginar a dinâmica da coisa, o que acontece quando uma unidade militar invade sua casa no meio da noite. 
Acabamos a busca, voltamos pra rua, batemos em algumas portas, lançamos algumas bombas de efeito-moral, fazemos algum barulho, corremos até a esquina, invadimos outra casa, revistamos a família, fazemos uma busca, subimos no telhado, pulamos de um telhado para o outro, descemos pela sacada de uma terceira casa... e assim você passa as oito horas do seu turno, isso 24 horas por dia, sete dias por semana. 
E, de setembro de 2000, quando começou a Segunda Intifada, até hoje, nós não paramos um segundo sequer. A ideia é simples: todo palestino precisa sentir que há um militar respirando em sua nuca. Você nunca sabe quando nós vamos aparecer, o que nós vamos fazer, quando vai começar, quando vai terminar, quantas horas vai durar... tudo isso é o que os militares chamam de tchushat nirdafut [em hebraico], criar o sentimento de estar sendo perseguido, caçado, criar esse sentimento em uma população inteira. 
A única forma de dominar um povo para sempre contra sua vontade é fazê-lo temer você. E assim que ele se acostuma àquele nível de medo, você tem de aumentá-lo.”

Como não encontrei a reportagem no site da “Ocas”, a íntegra pode ser lida no blog da fundação.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014 | | 0 comentários

Questões sobre jornalismo

Recentemente, li duas críticas jornalísticas que reforçaram convicções que carrego ao longo da carreira - e pelas quais lutei (inclusive "comprando briga" do ponto de vista conceitual com gente que, atrasada, virou-me a cara).

Uma diz respeito a uma noção (contemporânea talvez), reforçada pela explosão de meios, de que a comunicação exige conteúdo e forma - ambas de qualidade e caminhando juntas. Não se tem sucesso sem uma ou outra.

(...) É o modelo que restou à TV aberta, hoje, do jornalismo de tabloide. Como não há produção de notícia policial para tanta demanda, o que se vê continuamente é a sobreposição de coberturas, em canais e programas diversos ou no mesmo telejornal, caso do repetitivo "Hora Um". 

Mas o programa tenta não ser só isso. Seu trunfo, mais que uma tediosa agenda política de Brasília ou um requentado noticiário internacional, é a apresentadora Monalisa Perrone, que consegue tratar com naturalidade os assuntos sangrentos e com proximidade a audiência. (...)

Fonte: Nelson de Sá, “Informalidade do ‘Hora Um’ atenua jornalismo de tabloide”, Folha de S. Paulo, Ilustrada, 3/12/14.

A outra questão envolve os números - que, frios, costumeiramente indicam a prevalência do abstrato sobre o humano, disfarçam deficiências de apuração e escondem a preguiça. Jornalismo é, sobretudo, contar histórias de vida, de pessoas, de gente.

Isto sem considerar que os números, muitas vezes, enganam.
  
(...) Não é novidade que jornais e jornalistas gostam de qualquer notícia que possa ser "traduzida" em percentuais ou rankings. A preferência parte da crença de que algum grau de mensuração torna o conteúdo mais confiável e lhe confere uma aura de precisão ou seriedade. Se, em levantamentos extensivos como o do IBGE, isso é verdadeiro, em boa parte das vezes, é pura balela. (...)

Fonte: Vera Guimarães Martins, “Oh, céus! Oh, vida!”, Folha de S. Paulo, Ombudsman, 7/12/14.

Não sou visionário, apenas procuro fazer o que acho correto - de acordo com o que aprendi nos bancos da faculdade, nos congressos e seminários de que participei e com a vida. 

Um dia, quem sabe, volte a ter oportunidade de estar à frende de discussões como estas.

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Cai ou não cai?!

Eu alertei neste blog em 21 de setembro: o Palmeiras cai.

Ok, não caiu - mas por incompetência dos outros. se dependesse dele, exclusivamente dele, estaria mais uma vez na segunda divisão - a terceira vez em 12 anos.

Se salvou graças ao Santos e ao Coritiba (ou, visto de outra forma, graças ao Vitória e ao Bahia). 

Não se pode esquecer, porém, que o maior campeão do século 20 teve a pior defesa do campeonato e fez campanha de segunda divisão.

Ou seja: foi um rebaixado moral (da mesma forma que existem os campeões morais).

Que 2015 seja mais alvissareiro ao clube alviverde - e que a diretoria e o elenco façam valer a tradição e a grandeza da camisa e da história do clube e façam jus à beleza da nova casa palmeirense - o Allianz Parque.

* Leia também:

- San Gennaro!

- Sofrimento no Parque

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Trabalhando...

Fãs lotam a Comic Con e "Doctor Who" volta à TV Cultura em 2015:



Justiça virou meio para garantir acesso à saúde:

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Estelionato eleitoral petista chega à educação em SP

Não só em nível federal que o PT pratica estelionato eleitoral. Agora é a vez de São Paulo. Após passar várias campanhas (inclusive a mais recente, para o governo do Estado) com seus candidatos atacando a aprovação automática na rede estadual, a prefeitura da capital – liderada pelo petista Fernando Haddad – anunciou justamente a aprovação de alunos que não conseguiram nota suficiente para passar de ano. Em ouyras palavras, aprovação automática.

Faça o que eu digo, não faça o que eu faço... Ou: ouça o que eu digo, mas não repare no que eu faço... Ou: critico o que tu fazes, digo que não faço, mas faço.

E quando eu digo que são todos farinha do mesmo saco...

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As verdades sobre a crise da água em SP

Para quem quer entender melhor os motivos da atual crise da água e as soluções de fato (e não aquele blá-blá-blá demagógico, populista e marqueteiro de petistas e tucanos na última campanha eleitoral, que só falavam em obras para captação de água), recomendo a leitura da entrevista da urbanista Marussia Whately, do Instituto Socioambiental, ao jornal “Folha de S. Paulo”, publicada nesta segunda (8/12).

Ela critica o foco nas obras de adução quando grande parte do problema está na distribuição (sobre a qual nenhum político falou). “Se diminuirmos as perdas do sistema de 30% para 20%, economizaremos sete metros cúbicos de água por segundo, que é quase metade do que o Alckmin quer produzir com as novas obras propostas”, diz.

Também aponta o exemplo de Nova York (EUA), metrópole inchada como São Paulo, mas que foi mais inteligente ao se deparar com risco semelhante.

E traça um diagnóstico preocupante: “A previsão é de chuvas um pouco acima da média. Se for assim, o risco é alto de chegarmos a abril do ano que vem pior do que chegamos a abril deste ano. Se chover na média, teremos problemas. Se chover menos, é o caos”.

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A genialidade de Dalí em São Paulo

O trabalho de Salvador Dalí é provocador - como, via de regra, o dos surrealistas. 

Dalí, porém, acrescenta elementos extras ao incluir um forte tom de crítica social em muitas de suas obras (o caos atômico é tema recorrente), de tratar dos sonhos (tema sempre envolto em mistérios) e de recorrer à intensidade das cores e de incríveis efeitos de luz para tornar - o que parece paradoxal - ainda mais sombrios muitos de seus quadros.

Tive a oportunidade de ver pela primeira vez as obras de Dalí em 2005 no museu Reina Sofia (é lá que está "O Grande Masturbador", uma de suas obras mais conhecidas), em Madri (Espanha). Depois, em 2010, vi uma exposição só dele no Palazzo Reale, em Milão (Itália). 

Agora chegou a vez de Dalí pisar em São Paulo, com uma ampla retrospectiva (este é, aliás, o nome da mostra no Instituto Tomie Ohtake). São 24 pinturas, 135 gravuras e desenhos, 16 fotos e 39 documentos abrangendo "primordialmente a década de 1930, auge do movimento" (surrealista).


Entre as pinturas que mais chamaram minha atenção, estão "Autorretrato cubista" (1923 - primeira foto abaixo), "Idílio atômico e urânico melancólico" (1945 - quarta foto), "O sentimento de velocidade" (1931 - quinta foto), "Compsoição surrealista com figuras invisíveis" (1936 - sexta foto) e "O espectro do sex-appeal" (1934 - sétima foto):








Ao contrário de artistas como Van Gogh, que só conquistaram reconhecimento mundial após a morte, Dalí fez muito sucesso ainda em vida. Exemplo disso são as capas de revista que ele estampou - as principais publicações do mundo, geralmente em poses provocativas que misturavam ironia e humor (detalhe: não estou afirmando que estas eram as intenções do artista, e sim quais foram minhas percepções):

  



As mesmas sensações (ironia e humor) tive ao ver a série de fotos:


Também são interessantes as ilustrações que Dalí fez a partir de clássicos da literatura, como "Dom Quixote" e "Alice no País das Maravilhas":









A exposição é grátis (é preciso retirar senha antecipadamente - ela vale para o mesmo dia em que é retirada). O instituto fica na avenida Faria Lima, 201, entrada pela rua Coropés.

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“A cerimônia do adeus”

(...) "A vida é uma longa despedida de tudo aquilo que a gente ama", meu pai sempre repete (mas a frase é do Victor Hugo).

(...) Tem uma hora - e dizem que essa hora sempre chega - que para de doer. A parte chata é que, até parar de doer, parece que não vai parar de doer nunca. (...)

Fonte:
Gregorio Duvivier, "Folha de S. Paulo", Ilustrada, 8/12/14 (íntegra aqui).

sábado, 6 de dezembro de 2014 | | 0 comentários

Questões para refletir...

(...) É estranho, considerando o cenário político atual, ouvir alguns dos hinos que foram entoados por gente que clamava por democracia e ver o que aconteceu com alguns dos ícones daquela geração. Foi inevitável a sensação de que algo saiu fora do script. "O que há algum tempo era novo, jovem, hoje é antigo, e precisamos todos rejuvenescer." (...)

Fonte: Renato Andrade,
“Falso brilhante”, Folha de S. Paulo, Opinião, 6/12/14, p. 2.

***

(...) A gente sempre se pergunta o que um partido quer com a nomeação de um diretor de banco estatal. Implementar suas políticas de ampliação de crédito, discutir a adequação do banco às normas de Basileia, incrementar a bancarização? (...)

Fonte: Vinicius Torres Freire,
“Dilma e seus inimigos ocultos”, Folha de S. Paulo, Mercado, 4/12/14.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014 | | 0 comentários

Trabalhando...

Vem aí um ano cheio de feriados prolongados:



E o espirito de Natal já está nas ruas:

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Direto do toca-CD (49)

Saudade, vai dizer ao vento
Que a dor da desilusão passou
E saiba que não há tormento tão intenso
Como aquele que você me provocou
Saudade, tudo tem seu tempo
E o seu já terminou
Espero que depois de tudo que eu passei
Você me faça esse favor

Andei revendo tanta coisa em minha vida
E hoje posso controlar a emoção
Fui apagando cada sombra de amargura
Que havia dentro do meu coração

Agora, vou seguir outro caminho
Quem sabe esquecer o que passou
Saudade, diga ao vento que a tristeza deu um tempo
E não esqueça que você já me deixou

(“Vai dizer ao vento”, de Paulinho da Viola)

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Violência policial: um desafio mundial

Deu no “National Post”, um dos principais jornais do Canadá, em 6 de fevereiro último: policiais de Montreal atiraram contra um homem que agia violentamente carregando um martelo. O homem morreu horas depois no hospital. A vítima - pai e filho numa família bem sucedida - começou a apresentar problemas mentais nos últimos anos.

O fato gerou várias perguntas: o homem teria recebido amparo do sistema de saúde? Os policiais tinham alternativa que não fosse atirar? Se tivessem usado a taser, arma não-letal que dá um choque paralisante, o homem seria controlado? Os policiais têm treinamento suficiente para lidar com conflitos?

Vê-se, pois, que a violência policial não é realidade – e polêmica – apenas no Brasil. Atinge também países desenvolvidos (em proporções infinitamente menores, naturalmente).

Como bem coloca o “NP”, há questões simples e práticas envolvidas na história. “As pessoas querem acreditar que seus policiais são todos craques em tiros, capazes de acertar com precisão um pequeno pedaço de metal viajando a milhares de metros por segundo em um alvo em movimento, 100% das vezes. A vida real é diferente, como qualquer policial irá dizer”, escreveu Matt Gurney.

Ele cita que a maioria dos atiradores amadores é provavelmente melhor do que os policiais. E questiona a qualidade do treinamento policial no Canadá (imagine no Brasil). Para isso, participou de um treinamento. “Éramos todos capazes de atirar em alvos de papel fixos em um ambiente calmo, com apoio e bem iluminado, onde nossas vidas não estavam em perigo e nosso sangue não estava cheio de adrenalina”.

Gurney menciona ainda que, para minimizar os próprios riscos, policiais simplesmente miram nas partes maiores do corpo na hora de atirar. Assim, reduzem a chance de erro – e aumentam a de letalidade. (Lembre-se que muitas vezes o alvo está escondido ou em movimento.)

Ainda assim, escreve Gurney, muitos tiros são errados. Um estudo feito anos atrás pelo Departamento de Polícia de Nova York constatou um índice de precisão de 34%. Ou seja: dois terços dos tiros eram “balas perdidas”.

“Uma bala que erra o alvo não vira pó. Segue até atingir algo. Se tivermos sorte, este algo será o chão ou uma parede. Se não, poderá ser uma pessoa inocente, talvez até um outro policial.”

Gurney esclarece que não pretende justificar a morte do indivíduo, tampouco dizer que os policiais não teriam alternativa para controlar a situação, e sim deixar claro que os oficiais ganhariam se tivessem um treinamento melhor – de tiros e para lidar com situações de conflito (ou com doentes mentais, como era o caso).

E finaliza: “policiais muitas vezes atiram para matar por uma razão – tentar algo diferente não só significaria aumentar a chance de erro, mas também o risco para os cidadãos próximos”.

Em tempo: o artigo de Gurney não discute a questão do preconceito, muito presente neste tipo de ação em países como Brasil e Estados Unidos (leia mais aqui e aqui). 

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A teoria do egoísmo responsável

Ao fazer recentemente uma reportagem sobre o antropoceno, período geológico no qual o homem causa os problemas do planeta e é também responsável por encontrar as soluções, passei a refletir sobre o futuro. E desenvolvi uma teoria: a do egoísmo responsável.

Trata-se, como o nome indica, de uma alternativa (ou de uma saída) para viver sem preocupações coletivas complexas (que tornariam a vida um tormento, conforme esta teoria) e, ao mesmo tempo, buscar contribuir da forma que for possível.

O diagnóstico é mais ou menos claro, seja qual for o ramo de estudo (do clima e as alterações causadas pelo aquecimento global ao esoterismo e a teoria Gaia): estamos destruindo o planeta, um processo que ganha velocidade cada vez maior.


De acordo com o filósofo Luiz Felipe Pondé, o ser humano desenvolveu tecnologia e conhecimento que lhe permitem viver mais (a expectativa de vida aumentou de 30 a 40 anos ao longo dos últimos séculos) e estabeleceu uma sociedade baseada na riqueza – modelo que ele considera irreversível, já que sistemas alternativos fracassaram.

Está posto o problema: a insustentabilidade do desejo. Como associar nossos desejos de felicidade e consumo com os limites de recursos do planeta?

(Pondé alerta para o risco de uma espécie de fascismo verde ao se pensar em estabelecer limites por meio de uma governança global, mas isto é outra discussão.)

Na equação da vida, a soma de felicidade (consumo) e direitos resulta em degradação. Segundo o filósofo, o ser humano sonha ter o nível de consumo dos Estados Unidos e o de bem-estar social da Suécia, uma conta que definitivamente não fecha num mundo com mais de sete bilhões de pessoas.

O desejo humano, portanto, é perigoso. Corre-se o risco de se materializar o mundo pensado pelo filósofo inglês Thomas Hobbes da guerra de todos contra todos – vejamos a atual crise da água...

Ao refletir sobre estas questões, concluí que criamos uma armadilha. A não ser que ocorra uma catástrofe planetária, o mundo não vai aguentar.

O nível crescente de consumo (pense no seu celular e em quanto tempo você deseja trocá-lo por um novo) não é compatível com os recursos disponíveis. A população mundial segue crescendo em ritmo acelerado. Se o apocalipse não vier dos céus, virá da ação humana. Inevitável.

Contudo, por mais que este processo esteja acelerado, ainda levará algumas gerações para chegar ao ponto limite em que a vida humana se tornará insustentável. O que fazer, então?

Martirizar-se com uma preocupação coletiva – “o que estamos fazendo?” - ou mudar radicalmente de vida (abandonar quaisquer traços de consumo, passar a viver em meio a natureza, estabelecendo novos hábitos alimentares e abrindo mão de uma série de prazeres - viajar, por exemplo, que implica na queima de combustíveis fósseis, um dos principais elementos do aquecimento global)?

Daí surge a teoria do egoísmo responsável. Egoísmo porque pressupõe a preocupação individual – já que não viverei o fim, a extinção, o apocalipse, levarei minha vida normalmente sem maiores preocupações coletivas globais. Darei-me o direito dos pequenos prazeres cotidianos (um “fast food”, um carro, um celular, uma viagem...), etc.

Ao mesmo tempo, como parte desta escolha (de fazer parte da inevitável sociedade de consumo), terei ações responsáveis ao meu alcance: reciclarei o lixo, buscarei alimentos orgânicos, terei uma vida mais civilizada, não jogarei resíduos na rua, evitarei o desperdício de recursos, procurarei fontes sustentáveis de energia, etc. Será a minha contribuição – como na história do passarinho, de cada um, com pequenos gestos, fazer a sua parte.

Egoísmo responsável!

Em tempo 1: se alguém topar, será um prazer refletir se, de fato, criamos uma sociedade sem volta, um caminho inexorável. Criamos?

Em tempo 2: outro filósofo, Hélio Schwartsman, mostrou em recente coluna na “Folha de S. Paulo” como a melhoria de vida alcançada nas últimas décadas criou novos desafios para o ser humano no campo da saúde – “Estamos ficando mais saudáveis, mas isso apenas nos empurra para mortes mais sofridas”. E assim será, sempre.

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Frase

“Não se iludam. Isso que acontece na Petrobras acontece no Brasil inteiro. Em ferrovias, portos, aeroportos. Tudo. Acontece no Brasil inteiro.”
Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, um dos principais delatores dos esquemas de corrupção na estatal, em depoimento à CPI do Congresso

terça-feira, 2 de dezembro de 2014 | | 0 comentários

O fim ou a salvação do PT

Encontrei dia desses um conhecido economista, da lista dos "bã-bã-bãs" que sempre aparecem na mídia, e comentei que a indicação de Joaquim Levy para o ministério da Fazenda representaria, a média prazo, o fim do PT.

Obviamente, não uma extinção de direito, mas de fato - fruto do "estelionato" eleitoral decorrente da guinada definitiva à direita, em direção oposta à origem das bandeiras petistas.

A resposta que ouvi desse economista é bastante interessante e vai no sentido oposto: "O Joaquim Levy vai salvar o PT!".

Tendo a achar que os dois movimentos não são excludentes.

É esperar para ver...

sexta-feira, 28 de novembro de 2014 | | 0 comentários

E o beatle me fez chorar

Raríssimas vezes na vida eu tive a sensação de que o tempo parou. Pouquíssimas vezes eu me senti tão extasiado a ponto de entender que se a vida acabasse naquele momento tudo teria valido a pena e eu estaria feliz. Foram sensações únicas – e, creia, difíceis de descrever.

Não sou fã de música (daqueles que conhecem nomes, histórias e trajetórias), tampouco sou beatlemaníaco, mas decidi que não teria o direito de passar por esta vida sem assistir ao menos a um beatle. E assim decidi ir ao show de Paul McCartney no Allianz Parque.




 


Talvez o mais performático dos Beatles mostrou toda a sua energia em duas horas e meia de show, durante as quais Paul cantou e tocou instrumentos variados em todas as canções, além de brincar com o público com suas dancinhas, gestos e ao arranhar o português – adaptado para o público, saudado como “paulistas”. E vieram “Sampa”, “esta é para a molecada” até o “É nóis!!!” que provocou gargalhadas.

Não faltaram luzes e cores num show primoroso, digno do nome – show. Espetáculo também cairia bem para uma apresentação espetacular – em emoção e tecnologia. Do som potente, passando pelo cenário deslumbrante aos fogos de artifício e à chuva de papeis picados que encerrou a apresentação, tudo foi mágico.




Tenho usado muito esta palavra para (tentar) descrever aquilo que vai além do que os olhos conseguem enxergar, o ouvido ouvir e o coração sentir. Para sensações e experiências que parecem entrar no mundo do sobrenatural.

A chuva definitivamente não atrapalhou a noite. Foi poética – ela apertou justamente quando Paul cantou “Here Today” em homenagem ao parceiro John Lennon, assassinado em Nova York (EUA) nos anos 80. “São as lágrimas do John”, eu disse.

And if I say I really knew you well
What would your answer be
If you were here today

Oh, oh, oh
Here today

Well knowing you
You'd probably laugh and say that we were worlds apart
If you were here today
Oh, oh, oh
Here today

But as for me
I still remember how it was before
And I am holding back the tears no more
Oh, oh, oh
I love you, oh

What about the time we met
Well, I suppose that you could say that we were playing hard to get
Didn't understand a thing
But we could always sing

What about the night we cried
Because there wasn't any reason left to keep it all inside
Never understood a word
But you were always there with a smile

And if I say, "I really loved you"
And was glad you came along

If you were here today
Oh, oh, oh
For you were in my song
Oh, oh, oh
Here today
(De Paul McCartney)




Também emocionante foi a homenagem a George Harrison, com “Something” - a música composta pelo amigo já falecido tocando enquanto imagens deles apareciam no telão:

Something in the way she moves
Attracts me like no other lover
Something in the way she woos me

I don't want to leave her now
You know I believe and how

Somewhere, in her smile, she knows
That I don't need no other lover
Something in her style that shows me

I don't want to leave her now
You know I believe and how

You're asking me will my love grow
I don't know, I don't know
You stick around now it may show
I don't know, I don't know

Something in the way she knows
And all I have to do is think of her
Something in the things she shows me

I don't want to leave her now
You know I believe and how
(De George Harrison) 




E a noite seguiu entremeada por sucessos dos Beatles, dos Wings (a outra banda de Paul) e do próprio cantor em carreira solo. 

Até chegarem os momentos cruciais, que deveriam ser vividos por todas as pessoas. Primeiro veio “Hey Jude” – e, como já virou tradição, o estádio se iluminou com luzinhas dos celulares e faroletes do público. E foi ali, naquele momento, que eu desejei que o tempo parasse, numa eternidade linda e mágica.

Mas tinha mais. E quando surgiram os primeiros acordes de “Yesterday” não deu mais para segurar. A emoção aflorou, as lágrimas escorreram para se misturar com a abençoada chuva. Sim, o beatle me fez chorar.

Yesterday
All my troubles seemed so far away
Now it looks as though they're here to stay
Oh, I believe in yesterday

Suddenly
I'm not half the man I used to be
There's a shadow hanging over me
Oh, yesterday came suddenly

Why she had to go I don't know
She wouldn't say
I said something wrong now I long
For yesterday

Yesterday
Love was such an easy game to play
Now I need a place to hide away
Oh, I believe in yesterday

Why she had to go I don't know
She wouldn't say
I said something wrong now I long
For yesterday

Yesterday
Love was such an easy game to play
Now I need a place to hide away
Oh, I believe in yesterday
(De John Lennon e Paul McCartney)  


 


 


  
Paul McCartney é um daqueles poucos seres humanos que carregam uma aura além do comum. São capazes de contagiar qualquer ambiente com uma energia diferente. Perfumam o ar, aquecem a noite, acalentam os corações.

Já posso dizer: eu vi um beatle tocar ao vivo. Eu vi o tempo parar. Eu vi, por um instante, o mundo acabar. Feliz.

* Obrigado, Mirele!