domingo, 5 de agosto de 2012 | |

Novas e velhas plataformas do jornalismo (2)

Ken Doctor faz jus ao título de guru da indústria jornalística americana.

Seu livro "Newsonomics" destrinchou as transformações e desafios que jornais e revistas americanos enfrentaram com a irrupção da internet e apontou saídas para sua sobrevivência e solidez financeira. Seu blog é campeão de audiência entre profissionais da área.

Analista da consultoria Outsell, Doctor diz que a indústria jornalística tem diversas razões para comemorar em 2012, ao contrário do pessimismo de anos anteriores.

Ele afirma que o leitor já provou que está disposto a pagar por conteúdo exclusivo e de qualidade, vide o sucesso das assinaturas digitais do "New York Times", do "Financial Times" e do "Wall Street Journal".

Diz que o tablet é um aliado para quem acredita na leitura mais calma de textos mais longos e que os jornais estão aprendendo a usar mais sua marca. Ele falou à Folha de sua casa em Santa Cruz, Califórnia.

Folha - O "New York Times" conquistou mais de 400 mil assinantes para a edição digital. As pessoas vão se acostumar a pagar por notícia?
Ken Doctor - Essa assinatura digital está se tornando uma fonte incrível de receita. Se você faz certo, as pessoas vão assinar e pagar pelo conteúdo exclusivo. O sucesso da cobrança digital do "New York Times" e de outros títulos de qualidade é algo muito recente, com menos de dois anos. Se a circulação de jornais no ano passado movimentou US$ 30 bilhões, não tenho dúvidas de que uma boa parte desse negócio pode ser preservada.

O sr. destacou o tablet como uma grande notícia para as finanças dos jornais. Por quê?
Cada vez está mais claro que o tablet está substituindo o desktop e o laptop como instrumento para ler notícias. Está comprovado que o leitor lê reportagens mais longas e com mais calma no tablet que no computador. Também é uma plataforma melhor para os anunciantes, a propaganda funciona melhor nele. Essa transformação também corta um dos maiores custos dos jornais: a impressão.

As notícias produzidas e investigadas por jornais são "pirateadas" por vários sites, em que o acesso é de graça. Como mudar essa equação?
As pessoas estão se acostumando mais a pagar por conteúdo na internet, no tablet e na TV. Hulu [compartilhamento de filmes e programas de TV], Pandora [música], Comcast [cabo], Netflix [filmes] já oferecem vasto conteúdo se você pagar uma vez por mês. Se for fácil para pagar, confortável, e não for apenas uma réplica em "pdf" do que está impresso, as pessoas estão começando a pagar. Talvez a edição de domingo em papel se mantenha por mais tempo; as outras terão mais interatividade digital durante a semana.

O leitor terá um peso maior nesse novo ambiente?
As empresas jornalísticas vão ter que se acostumar a ter mais dinheiro dos leitores que dos anunciantes. A relação muda. As receitas costumavam vir 80% dos anunciantes e 20% das assinaturas nos EUA. Na Europa, a divisão era 35% dos leitores, 65% dos anunciantes. Mas no Japão o assinante sempre foi 70%. É para onde estamos indo.

O que esse leitor que paga na internet busca?
O jornal da minha cidade, o "Santa Cruz Sentinel", tinha 14 repórteres cobrindo o noticiário local. Na crise, foi demitindo, sobraram oito. Ainda é um bom número porque, comparativamente, nem as redes de TV nem os jornais nacionais cobrem o meu cotidiano. Por esse conteúdo, eu quero pagar. Notícias de celebridades eu posso ler de graça em qualquer site nacional. Agora, o que o "Sentinel" fala de educação, notícias locais, investigação, ninguém cobre como eles. O leitor vai decidir. Redações que sacrificaram demais seu time de repórteres terão mais dificuldade de provar ao leitor que ele recebe um conteúdo que vale a pena.

Fonte: Raul Juste Lores, “Leitores estão dispostos a pagar por conteúdo digital exclusivo”, Folha de S. Paulo, Mercado, 5/8/12, p. B-12 (para ler na íntegra, clique no link – é preciso ter senha do jornal ou do UOL).

0 comentários: