terça-feira, 10 de julho de 2012 | |

Novas e velhas plataformas do jornalismo

David Carr, 55, repórter e colunista de mídia do "New York Times", acompanhou nas últimas semanas o agravamento da crise nos jornais regionais dos EUA. Noticiou que o "Times-Picayune" de Nova Orleans, fundado em 1837, passaria a publicar três edições por semana, contra as sete atuais. E relatou a transformação do "U-T San Diego", de 1861, em porta-voz dos interesses comerciais de um novo proprietário.

Carr, que estará em São Paulo no próximo sábado, no congresso da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), avalia que a imprensa americana enfrenta "ameaça existencial". (...)

Folha - Na sua cobertura, o sr. vê o momento atual como último estágio de uma era no jornalismo.

David Carr - Sim, estamos falando de uma ameaça existencial. É algo que quem ama jornais, como eu e provavelmente você, pode até torcer contra, mas realmente não se pode parar o que vem por aí... Quer dizer, eu sei que o setor de jornais no Brasil também enfrenta os seus desafios, mas está muito mais saudável do que aqui, certo?

Folha - O que o sr. vê como maior efeito dessa disrupção nos EUA? Mais "paywall"?

Carr - Acima de tudo, é a perda de potência, de músculo institucional em reportagem. Sou menos um romântico da imprensa que um fã do jornalismo e da reportagem, então o problema é que o modelo de negócios não sustenta o nível de jornalismo que havia. No mercado americano, os jornais regionais tinham um virtual monopólio e lucraram tanto que não sabiam o que fazer com o dinheiro, então enfiaram em reportagem. De certa maneira, a era de ouro do jornalismo foi anômala, em termos econômicos. Quando esses monopólios regionais foram desagregados pela internet e pela mudança de hábito dos leitores, nós já tínhamos nos acostumado a um nível de reportagem que não teremos mais.

Folha - A crise afeta os jornais nacionais, como o "New York Times", mas eles parecem ter espaço de manobra para buscar novas fontes de receita.
Carr - Temos mais espaço do que tínhamos até pouco tempo atrás. Temos flexibilidade operacional, porque estamos pagando os empréstimos e, principalmente, porque o "paywall" está funcionando. Mas estamos com um grande desafio. As pessoas ficam esperando que o mercado publicitário retorne. Não vai. Esta é a nova normalidade. Se vamos avançar para o futuro, e penso que vamos, será com uma variedade de negócios sob a marca "The New York Times". Parte será vídeo, parte será social, haverá um monte de pequenas empresas sob esta outra. (...)

Folha - Qual é a lição que o sr. tira dessa experiência com "paywall" no "NYT", em termos de fidelidade do leitor, de acesso grátis por mídia social e da simples qualidade do jornalismo?
Carr - Uma das lições é que dizem que as pessoas não vão pagar por algo que tem sido grátis: isso não é verdade. As pessoas pagam por água em toda parte nos EUA, elas querem que tenha uma certa qualidade, uma marca específica. Há pessoas que claramente já queriam pagar. A razão por que eu pago pelo acesso ao "Wall Street Journal" e ao "Financial Times" não é só achar algo neles. Se realmente quisesse, com ou sem "paywall", eu conseguiria. Mas estou disposto a pagar um valor conveniente para poder acessar quando quiser, como quiser, quanto quiser. Não é um negócio de massa. Há 300 milhões de pessoas nos EUA e meio milhão pagam pelo "NYT" na internet, portanto, não dá para dizer que seja um negócio imenso. Mas é muito real. E eu acredito que a decisão de manter os ativos institucionais nos torna capazes de cobrar pelo que fazemos. Não passamos por todos os tipos de cortes que o "Washington Post" fez.

Folha - Os tablets cumpriram a promessa que anunciavam para a mídia impressa?
Carr - Em termos de leitores, sim. Hearst, uma das grandes editoras de revistas nos EUA, está perto de 1 milhão de assinantes. O "Wall Street Journal" e o "New York Times" também têm sido felizes vendendo aplicativos. Em termos de nova oportunidade para mensagens publicitárias, creio que não aconteceu ainda. Não acho que já tenhamos solucionado. Mas posso dizer, pelos meus hábitos, que o tablet revolucionou a maneira como consumo conteúdo.

Fonte: Nelson de Sá, “Cobrar conteúdo on-line é reação a menos publicidade”, Folha de S. Paulo, 9/7/12.

Em tempo: reproduzi só alguns trechos da entrevista. Para ler na íntegra, via link, é preciso ter senha do jornal ou do UOL.

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