quarta-feira, 6 de julho de 2011 | |

Incongruências de um Brasil varonil

Está em vigor desde segunda-feira a Lei 12.403/11, apelidada “lei das prisões” (ou “lei da impunidade”, como queira). Ela estabelece novas regras para a prisão preventiva, ou seja, das pessoas que ainda não tiveram condenação em juízo. A nova norma praticamente força a adoção de medidas alternativas à prisão para quem for acusado de crimes leves (puníveis com até quatro anos de prisão).

No programa que faço diariamente na TV Jornal, tenho criticado a lei. Não exatamente a lei, mas sua aplicação no Brasil. Olhando clinicamente, a norma parece adequada. Determinados tipos de crimes, e conforme o histórico do acusado, exigem medidas cautelares que não necessariamente a reclusão.

O que critico é a falta de estrutura – pessoal e material – do país para fazer cumprir tais medidas. Em Limeira, o juiz da 2ª Vara Criminal, Luiz Augusto Barrichello Neto, também corregedor dos presídios, estima que seriam necessárias mil tornozeleiras eletrônicas para fazer o monitoramento dos presos provisórios.

Estes equipamentos, porém, não existem. As poucas tornozeleiras à disposição da Justiça local são usadas para presos condenados durante as chamadas saídas temporárias.

Sem tornozeleiras, restam outras medidas. A prisão domiciliar é uma delas. Quem, porém, há de fiscalizar seu cumprimento? As forças de segurança têm um sistema integrado de informações de modo que um policial militar saiba se uma pessoa averiguada na rua está sob medida cautelar de prisão domiciliar, por exemplo?

A resposta me parece óbvia – daí a crítica à nova lei.

Hoje, no Brasil, se uma pessoa é foragida em um Estado, a polícia de outra unidade da federação não é comunicada. Só nesta quarta-feira o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou uma resolução determinando a criação de um banco de dados com todos os mandados de prisão expedidos no país.

“Hoje, é muito comum a pessoa presa em flagrante já ser procurada pela Justiça de outro estado e não se ter notícia disso, principalmente em locais muito distantes”, explicou à Agência Brasil o conselheiro Walter Nunes, do CNJ. Segundo a agência, o cadastro ficará na Internet, para consulta pública. Os tribunais têm seis meses para cadastrar os mandados (leia a íntegra aqui).

A criação do banco de dados é uma determinação da nova lei, cita a agência. Contudo, fosse o Brasil um país sério e organizado, as novas regras para as prisões só entrariam em vigor APÓS este banco entrar em operação, não o contrário.

Daí minha conclusão de que o Brasil não está minimamente preparado para ter normas avançadas. Isto vale não só para a recém-criada “lei das prisões”, mas também para o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – grande parte dos municípios não dispõe sequer de Conselho Tutelar para resguardar os direitos da infância e juventude - e o Estatuto do Idoso, só para ficar em dois exemplos.

É na falta de estrutura que esbarra também a discussão sobre a descriminalização do uso de drogas. Numa recente reportagem para a TV Jornal, três especialistas manifestaram em uníssono que o Brasil não tem preparo – seja na esfera policial ou na de saúde pública – para atender de modo adequado os dependentes químicos.

Daí ser legítimo o temor da comunidade de que a nova “lei das prisões” torne-se, na prática, a “lei da impunidade”.

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